terça-feira, 24 de março de 2015

Projeto quer acabar com revista íntima nas cadeias e carceragens do Paraná

Publicada em agosto de 2014, uma resolução do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP) que proíbe a chamada revista íntima nos presídios do país não é obedecida no Paraná. Agora, um projeto de lei em trâmite na Assembleia Legislativa do estado, e que também determina o fim do procedimento, gerou polêmica entre agentes penitenciários e corre o risco de não vingar.
De autoria da deputada estadual Claudia Pereira (PSC), o Projeto de Lei 95/2015 é semelhante à resolução número 5/2014 do CNPCP, que é um órgão do Ministério da Justiça. Pela proposta da parlamentar, a revista íntima não pode ser adotada para as pessoas que visitam os detentos. No texto, a revista íntima é definida como todo procedimento que obriga a pessoa a “despir-se; fazer agachamentos ou dar saltos; e submeter-se a exames clínicos invasivos”. O projeto de lei também determina como deve ser feita a revista: apenas de forma mecânica e em local reservado, “por meio de tecnologias que preservem a integridade física, psicológica e moral” do visitante.
O texto da parlamentar também define regras para quando houver suspeita de “objeto ou substância ilícita” durante a revista mecânica. Pelo projeto de lei, se a pessoa suspeita insistir na visita, ela deverá ser encaminhada para um ambulatório, “para os procedimentos adequados de averiguação da suspeita.” 
Faltam scanners 
No Paraná, de acordo com a Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp), a revista íntima só não é utilizada quando a unidade prisional tem um aparelho chamado body scanner, cuja tecnologia para detectar drogas e objetos substitui qualquer outra forma de revista. Mas, para as 32 unidades prisionais administradas pelo governo do Paraná, existem somente três aparelhos do tipo: um para atender as seis unidades da Penitenciária Estadual de Piraquara; outro na Casa de Custódia de São José dos Pinhais; e um terceiro na Penitenciária Estadual de Londrina 2 (PEL 2). Os scanners são alugados, estão em funcionamento desde o ano passado, apenas, e custam R$ 17,2 mil por mês, cada um.
Ainda segundo a Sesp, nos próximos 60 dias, mais dois scanners corporais serão instalados na Penitenciária Estadual de Cascavel e na Penitenciária Estadual de Foz do Iguaçu.
Segundo a pasta, embora só o scanner corporal seja capaz de substituir integralmente a revista íntima, outros aparelhos são utilizados nas unidades prisionais. “As demais unidades prisionais do estado contam com o portal detector, aparelho raio-x e detector manual para auxiliar nessa atividade”, informou a Sesp.
A pasta também enfatizou que a revista íntima é uma última etapa do procedimento, feita quando há suspeita de irregularidades ou reincidências.
Em relação ao projeto de lei, a Sesp disse apenas que a matéria está em análise na pasta. Um parecer deve ser dado ao Legislativo dentro de dez dias.

 “A pena não pode atingir os familiares”, diz deputada autora do projeto
Para a deputada estadual Claudia Pereira (PSC), autora do projeto de lei, o procedimento de revista íntima é uma maneira de “estender a pena para os familiares do detento”. “Sou advogada há 15 anos, já fiz estágios em presídios, e é algo que sempre me causou indignação. Já vi mulheres desistindo de fazer a visita por causa da revista íntima”, critica.

Questionada sobre o custo do aparelho de scanner corporal, a parlamentar afirmou que “o estado vai ter que ver o que é prioridade”.

Para ela, o aparelho também significa segurança efetiva: “O método que temos hoje não é eficaz. Se conseguíssemos impedir a entrada de drogas e objetos nas celas, alguns poderiam até justificar a revista íntima. Mas sabemos que é um método vexatório e que nem é eficiente. Quantas coisas são apreendidas frequentemente nas celas?”, argumenta

No Rio de Janeiro, Legislativo propõe pagar por aparelhos
No Rio de Janeiro, onde uma lei semelhante foi aprovada neste mês pelo Legislativo estadual, o custo do aparelho de revista também foi objeto de debate. Na última sexta-feira, o presidente da Assembleia Legislativa do Rio, deputado estadual Jorge Picciani (PMDB), sugeriu ao governador Luiz Fernando Pezão (PMDB) que o Legislativo financie a compra de scanners corporais para a Secretaria de Estado de Administração Penitenciária. A lei ainda está à espera de sanção ou veto do governador Pezäo. Segundo o Legislativo do Rio, só existe um equipamento de scanner corporal em todo o estado, usado no Complexo Penitenciário de Gericinó, na zona oeste

Para agentes penitenciários lei ficará no papel por falta de dinheiro
Para o presidente do Sindicato dos Agentes Penitenciários do Paraná (Sindarspen), Anthony Johnson, a aprovação do projeto de lei preocupa. Segundo ele, “num estado onde não se tem dinheiro nem para comprar um parafuso”, uma lei assim pode se tornar “ineficaz”.

A forma de revista hoje é constrangedora para os dois lados, tanto para o visitante quanto para o funcionário. Nós também queríamos que a revista íntima acabasse. Mas o problema é que a gente sabe que o governo estadual não vai ter dinheiro para colocar o aparelho em todas as penitenciárias. E o que acontece daí?”, critica.

Johnson destaca que o body scanner é caro e que, em São Paulo, onde lei semelhante foi sancionada em agosto do ano passado, a aplicação da regra trouxe problemas. “Lá está um caos. Não tem os aparelhos e ninguém sabe se faz a revista ou não”, conta ele. A Sesp informou que os três aparelhos existentes nas unidades prisionais são alugados e custam aos cofres R$ 17,2 mil por mês, cada um.

“Queremos discutir o projeto de lei. Nós não fomos chamados pela deputada. A nossa preocupação é com a segurança. Não defendemos a revista íntima, mas sabemos que ela inibe a entrada de muita coisa nas celas”, relata.

Risco
Balanço divulgado pela Sesp no começo do ano, sobre uma operação feita em 120 carceragens de delegacias e cadeias públicas durante 15 dias, registrou a apreensão de 562 celulares com detentos, além de 295 carregadores, 395 baterias, 156 chips e 363 “artefatos e armas artesanais”.

De acordo com a Sesp, dependendo do que for encontrado com o visitante, ele pode ter de assinar um termo circunstanciado e até ser preso, como quando portar drogas, por exemplo.

O sistema penitenciário do Paraná abriga cerca de 18 mil presos. Nas seis unidades do Complexo Penitenciário de Piraquara, por exemplo, passam, em média, 700 pessoas em cada dia de visita.

Fonte: Catarina Scortecci, especial para a Gazeta do Povo

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