quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Do amor e o cumprimento das penas


*Wagner Dias Ferreira

 As teorias jurídicas mencionam características como a retribuição, a expiação, a reeducação e a ressocialização quando aplicamos, por meio dos instrumentos de investigação, apuração da prática de crimes, bem como dos mecanismos de execução penal, a um determinado agente as penas previstas em legislação criminal.
Cada um destes aspectos se relaciona diretamente com valores humanos e sociais tais como segurança jurídica, paz social, igualdade de oportunidades e harmonia nas relações sociais.
A retribuição advém da necessidade que a sociedade possui de resposta à conduta antijurídica e culpável do agente afrontando o meio social e perturbando o aspecto de estabilidade e segurança jurídica que deve sempre imperar nas relações humanas.
A expiação implica na necessidade de o agente refletir sobre a conduta reconhecendo seu caráter reprovável e por isso buscando o arrependimento dos atos realizados de modo a restaurar a paz no meio social.
A reeducação se ocupa de fornecer ao agente elementos novos para que ele possa, ao retomar o convívio social pleno, ele tenha instrumentos para redirecionar suas condutas afastando-se das práticas delitivas, o que somente se vislumbra com a promoção da igualdade de oportunidades.
Por fim, a ressocialização visa recolocar o agente no meio social de modo que ele, ao retornar a este convívio, conduza suas ações e vida de modo a manter a harmonia social.
Esta, de forma simplista, é a teoria. Quando observamos neste recorte particular a proposta teórica para o cumprimento das penas e confrontamos os elementos teóricos com a realidade que se encontra nos ambientes desta execução, quaisquer que sejam, constatamos que a sociedade vem recebendo como retorno desses agentes exatamente o tratamento que dá a eles quando condenados. “Faça aos outros o que quer que eles façam a vocês” é máxima cristã muito realista para este ambiente.
Muitos cristãos de hoje lembram-se muito do bordão “ama ao próximo como a ti mesmo” e permanecem presos a isso, ignorando, por comodismo, a complexidade do princípio de fazer aos outros o quer que eles façam a você.
A sociedade ocidental na qual hoje vivemos é uma evolução natural da interpretação feita pela humanidade destes princípios. E nem de perto as estruturas sociais que encontramos demonstra a presença destas premissas. Vale dizer que o excesso de interpretações prejudica o reconhecimento límpido e claro da verdade inscrita no princípio cristão.
Manter presos em presídios superlotados, sucatear as estruturas de acompanhamento de penas substitutivas, mais conhecidas como penas alternativas, posto que se apresentam como alternativas à pena de prisão, sucatear as varas de execuções penais, principalmente, nas comarcas onde existem enormes complexos penitenciários, o que gera atrasos de meses na apreciação de pedidos de benefício nos processos de execução ou na solução de incidentes de qualquer natureza, chegando por vezes a acontecer de dois presos em condições absolutamente similares receberem tratamento distinto, ou de simplesmente um processo desaparecer sem explicações e isto ser ignorado pela justiça sem maiores consequências.
Basta ver que audiências de justificação em processos onde um determinado benefício é suspenso pelo juiz são marcadas com prazo de quatro a seis meses, em total afronta ao princípio da presunção de inocência, já que impõe-se ao condenado a suspensão de seu benefício antes de se apurar a veracidade ou não da situação que lhe foi atribuída.
O descaso com os ambientes destinados ao cumprimento de penas bem como com os organismos encarregados de sua execução, inclua-se aí o tratamento dispensado pelo poder público aos agentes de segurança penitenciário, mantidos em constante regime de insatisfação o que muitas vezes afetam seu trato com o trabalho, gerando adoecimento e por muitas vezes aborrecimentos com as pessoas que atendem (presos, familiares de presos, advogados) em razão de uma estrutura viciada no trato profissional.
Mesmo com exemplos como o do papa João Paulo II que depois de algum tempo procurou o homem que atentou contra sua vida e na prisão onde este se encontrava buscou com ele algum tipo de reconciliação e perdão, nossa sociedade continua diante de acontecimentos conjunturais buscando, não a reconciliação, o arrependimento e o perdão, mas aumentar o caráter de retribuição vingativo existente em toda pena criminal. Este caráter retributivo muitas vezes o único aspecto reconhecido da pena, é amplamente gritado como sendo a justiça, e se for tomado isoladamente está muito distante de ser justiça. Senão a satisfação de um sentimento vingativo inconfessável nestes termos propalado, como justiça, na hora da dor.
Este tipo de justiça manifesta sem o ânimo calmo e refletido não pode continuar a gerar respostas legislativas dos congressistas brasileiros, em busca exclusivamente de elementos para compor um discurso eleitoreiro, sem compromisso nenhum com uma sociedade que já está cansada de prover um sistema de cumprimento de penas sem resultados, exatamente porque não cuida de cumprir a integralidade dos princípios que regem o cumprimento da pena, permanecendo reconhecido por todos como ambientes ditos “Universidade do Crime” é importante que se busque eficiência no cumprimento de penas para fazer valer os investimentos.
Vale lembrar que toda a sociedade ocidental que encontrou seus fundamentos mais fortes nas bases do império romano tem no seu processo de evolução histórica a presença de um pensamento: que em algum período  de seu desenvolvimento houve a cristandade, por isso, é tão estranho observar que os princípios de amor estejam tão distantes do modo de pensar mais vivo dos seres humanos de hoje.
Partindo do pensamento cristão não se trata de defender presos, seus familiares ou quaisquer outras minorias, mas de defender a sociedade em geral, as chamadas pessoas de bem, pela garantia de direitos a todos, para restauração humana interrompendo o círculo vicioso da violência. Amar ao próximo segundo o ensinamento constante na parábola é dar um tratamento digno àquele que se encontra em situação de desfavorecimento, assim dar dignidade ao preso, a seus familiares, às minorias em geral é o melhor mecanismo de se construir uma sociedade sem exclusão, segura, pacífica, com igualdade e harmônica para todos.
*Advogado e Membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB/MG

Dr. Wagner Dias Ferreira - Advogado
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