sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Por falta de lei, Supremo deverá definir conceito do crime de terrorismo

Criada para marcar o fim de um período autoritário e de grandes conflitos sociais, a Constituição de 1988 estabeleceu o repúdio ao terrorismo e definiu que atos terroristas são crimes inafiançáveis e insuscetíveis de anistia ou graça. No entanto, mais de 20 anos depois, o sistema jurídico brasileiro ainda não possui uma lei que defina claramente o que é terrorismo.
Documentos sigilosos da diplomacia norte-americana tornados públicos nesta semana pelo site Wikileaks apontam que, em 2007, o Governo brasileiro decidiu barrar a aprovação de uma lei antiterrorismo. O motivo: a dificuldade na definição do que seriam atos terrortistas –o que poderia colocar em risco a atuação de movimentos sociais como o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra).
Diante desse vácuo legal, a tarefa de tipificar o crime de terrorismo poderá ficar a cargo do STF (Supremo Tribunal Federal), que enfrentará a questão no julgamento de um pedido de extradição.
Em junho deste ano, o ministro Celso de Mello negou a prisão preventiva de um estrangeiro que vive no Brasil e é acusado de terrorismo em seu país de origem.
O ministro pediu ao país requerente mais detalhes sobre os crimes que são imputados ao estrangeiro, uma vez que a Constituição só permite que alguém seja extraditado se for acusado de atos que também sejam crimes no Brasil –como o processo corre sob segredo de Justiça, o nome do acusado e do país que pede sua extradição não foram divulgados
No despacho (leia íntegra aqui), Celso de Mello destaca que mesmo na comunidade internacional o conceito de terrorismo ainda não está completamente definido. “Até o presente momento, já foram elaborados, no âmbito da Organização das Nações Unidas, pelo menos, 13 instrumentos internacionais sobre a matéria, sem que se chegasse, contudo, a um consenso universal sobre quais elementos essenciais deveriam compor a definição típica do crime de terrorismo”, observa o ministro.
Controvérsia jurídica
A indefinição sobre o conceito de terrorismo no Brasil decorre da falta de clareza de duas leis que tratam do tema e ainda estão em vigor. A primeira é a Lei de Segurança Nacional (Lei 7.170/83), criada durante o regime militar, que estabelece pena de 3 a 10 anos de prisão a quem “devastar, saquear, extorquir, roubar, seqüestrar, manter em cárcere privado, incendiar, depredar, provocar explosão, praticar atentado pessoal ou atos de terrorismo, por inconformismo político ou para obtenção de fundos destinados à manutenção de organizações políticas clandestinas ou subversivas”.
Especialistas apontam que, além de ser ilegítima, por ter sido criada pela Ditadura para reprimir opositores, a norma também seria dúbia, já que a conjunção adversativa “ou” dá a entender que atos de terrorismo são distintos das condutas descritas anteriormente.
A outra norma é a Lei de Crimes Hediondos (8.072/90), criada para regulamentar a nova Constituição democrática. No que concerne ao terrorismo, no entanto, a lei apenas repetiu aquilo que já esta descrito na Constituição, ou seja, que atos de terrorismo são crimes inafiançáveis e insuscetíveis de anistia e graça.
Na decisão, Celso de Mello ainda lembra que o Brasil assinou pactos internacionais contra o terrorismo, como a Convenção Interamericana Contra o Terrorismo, no âmbito da OEA (Organização dos Estados Americanos). Entretanto, esses acordos internacionais também não fizeram descrição definitiva do crime de terrorismo.
O Plenário do Supremo deverá discutir o tema no julgamento do mérito do pedido de extradição, que não tem prazo definido segundo a assessoria de imprensa do STF.


Fonte: Última Instância

Nenhum comentário:

Pesquisar este blog