segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Inglaterra estuda como reduzir reincidência no crime

Metade dos prisioneiros na Inglaterra e no País de Gales comete outro crime em até um ano após a liberdade. Lidar com esse problema é o próximo passo da reestruturação do sistema judiciário britânico anunciada pelo governo. Esta semana, foi aberta consulta pública sobre o sistema prisional. A sociedade inglesa tem até março para sugerir maneiras de tornar o sistema mais eficaz. Em maio, de posse do resultado da consulta, o governo britânico promete anunciar os planos concretos para o que está chamando de uma reforma radical da Justiça criminal no país.
Os problemas britânicos não são diferentes dos brasileiros. Presídios lotados, muito dinheiro envolvido e pouco resultado no combate à criminalidade. O principal fantasma da segurança britânica é a reincidência no crime. Até por isso o pacote ainda em fase de composição é chamado de quebrando o ciclo. A ideia é tornar tanto a punição como a reabilitação do condenado efetivas para garantir segurança para a sociedade.
Ao anunciar a abertura da consulta pública, o secretário de Justiça, Kenneth Clarke, observou que mesmo com gastos recordes no sistema judicial criminal, ele ainda é ineficiente em proteger a população. As prisões devem ser também lugares de trabalho duro, disse Clarke, e os condenados precisam ser reabilitados para que não deixem as cadeias e voltem diretamente para o crime.
Escola do crime
De acordo com estatísticas do Ministério da Justiça britânico, a população carcerária praticamente dobrou no período entre 1993 e dezembro de 2010. Agora, são mais 85 mil atrás das grandes na Inglaterra e no País de Gales. Desses, segundo as estatísticas, metade vai cometer outro crime antes de completar um ano da saída da prisão. O custo dessas reincidências para os cofres públicos, segundo o governo, pode chegar a 10 bilhões de libras esterlinas (cerca de R$ 27 bilhões) por ano.
O ponto nevrálgico são justamente aqueles que cometem crime pouco ofensivos. Em 2008, 61% dos condenados a pena inferiores a um ano reincidiam pelo menos uma vez logo nos 12 primeiros meses de liberdade. A droga e o álcool também são problemas a serem enfrentados. Mais de 70% dos prisioneiros que responderam a uma pesquisa divulgada pelo Ministério da Justiça afirmaram ter usado drogas um ano antes de serem presos. Pouco menos da metade tem problemas com álcool.
Com a anunciada reforma radical, o governo britânico pretende lidar com todos esses problemas. A ideia é colocar o preso para trabalhar, com disciplina e carga de trabalho iguais às de um trabalhador livre, e também criar mecanismos para reparar os danos que ele cometeu para a vítima e para a sociedade como um todo. Programas para tirar os presos das drogas e inserir no mercado de trabalho, uma vez que deixem a prisão, também fazem parte das propostas do governo.
O governo também quer aprimorar o sistema judicial criminal para os jovens. Na Inglaterra, uma criança de 10 anos já pode sentar no banco dos réus de um tribunal. De acordo com o Ministério da Justiça, 74% dos jovens que vão parar atrás das grades cometem outro crime em até um ano depois de sair da prisão.
Faxina na Justiça
A reforma no sistema penitenciário é mais um passo da remodelação que o governo britânico vem propondo no Judiciário inglês e do País de Gales. Há pouco menos de um mês, foi anunciada a intenção de fazer cortes drásticos na assistência judiciária. De acordo com o governo, são gastos por ano mais de dois bilhões de libras esterlinas (cerca de R$ 5,5 bilhões) para garantir Justiça gratuita e advogado para os financeiramente menos favorecidos. A proposta é cortar pelo menos um sextos desses gastos.
A ideia é restringir o benefício, limitando os casos em que um cidadão pode recorrer à Justiça sem custo nenhum. As propostas, resultado de uma consulta pública aberta em fevereiro, já foram apresentadas ao Parlamento. Na Justiça criminal, não haveria cortes de assistência judiciária. As mudanças aconteceriam nos casos civis. Brigas de família deixariam de contar com ajuda do governo quando levadas à Justiça. Também ficariam fora processos por erro médico, discussões por dívidas, conflitos sobre educação, moradia, emprego e imigração (clique aqui para ler mais).
Entre as medidas para cortar os gastos da Justiça, está o polêmico fechamento de 157 tribunais da Inglaterra e do País de Gales (clique aqui para ler). A medida ainda está em fase de estudo. Até setembro, foi feita uma consulta pública para que a população pudesse falar o que pensa da ideia.
A Inglaterra e o País de Gales têm atualmente 530 cortes de Justiça. Dessas, 330 são Magistrate’s Courts, espécie de Juizado Especial; 219 são County Courts, o equivalente britânico aos tribunais estaduais; e 91 Crown CourtCentres, que cuidam dos processos criminais e são onde acontecem os júris. Estes últimos não sofreriam corte. A proposta do governo é eliminar 103 Magistrates’ Courts e 54 County Courts.
A justificativa prática e imediata para o corte proposto, de acordo com o secretário de Justiça, é a economia. Segundo dados apresentados por ele, o fechamento dos quase 160 tribunais vai poupar 21 milhões de libras esterlinas (quase R$ 56 milhões) para os cofres públicos de uma vez só e outros 15,5 milhões (R$ 41,1 milhões) ao ano, que eram gastos com a manutenção dos tribunais.

Revista Consultor Jurídico, 11 de dezembro de 2010


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