quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Mato Grosso terá estudo sobre estresse policial

A profissão de policial é uma das mais desgastantes pois são profissionais que vivenciam no dia-a-dia situações de conflito, violência, morte, que precisam aprender a gerenciar. Segundo o psicólogo Lucio Emanuel Novaes, do Centro de Psicologia de Controle do Estresse, o desgaste do profissional de segurança é tanto que 15 anos de trabalho de um policial militar corresponderia a 30 anos de um profissional de outra área qualquer. Segundo Novaes, 50% das mortes do mundo estariam relacionadas com doenças ligadas ao estresse (dados da Organização Mundial da Saúde (OMS).

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A Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp), por meio do Ministério da Justiça e do Fundo Nacional de Segurança Pública, disponibilizou cerca de R$1 milhão, por meio de convênio federal, às secretarias de Justiça e Segurança Pública de dez estados - Amazonas, Mato Grosso, Piauí, Rio Grande do Norte, Santa Catarina, Sergipe, Tocantins, Roraima, Rondônia e Paraíba -, para investimento na qualidade de vida, identificação dos principais sintomas e causas do estresse dos profissionais de segurança pública.

Mato Grosso iniciou no dia 13 de agosto o Programa de Prevenção e Gerenciamento do Estresse para a Segurança Pública, que irá avaliar o nível de estresse e qualidade de vida dos profissionais da segurança pública. A avaliação será realizada através de um mapeamento envolvendo 1.489 policiais militares, 430 policiais civis, 197 bombeiros militares e 150 servidores da Perícia Oficial e Identificação Técnica (Politec). A amostra total incluirá quase de 2.300 servidores. O programa terá duração de um ano.

A diretora do Centro Psicológico de Controle do Estresse e professora doutora da PUC de Campinas, Marilda Novaes Lipp, explicou que o programa tem como objetivo a sensibilização da categoria para o combate ao estresse, a avaliação da sua condição e auxílio na busca da qualidade de vida em suas ações.

Marilda Lipp contou que, num primeiro momento, foram realizadas palestras com os profissionais que possuem cargos estratégicos sobre o que é o estresse e a aplicação de um questionário. O passo seguinte é a avaliação das respostas e a formulação de relatórios individuais. A partir desses relatórios, será avaliado o nível de estresse do profissional e feitas recomendações.

"Para a realização desse programa serão contratados três psicólogos, um psiquiatra e um massoterapeuta. Iremos formar facilitadores para o trabalho de manutenção do programa, que será uma oportunidade de enfrentar as causas do estresse para obter qualidade de vida", destaca Marilda Lipp (foto). Um trabalho semelhante foi realizado por ela em São Paulo, onde se detectou que 43% dos delegados da Polícia Civil e 60% dos policiais militares estão com níveis de estresse acima do aceitável.

Para o diretor da Polícia Civil de Mato Grosso, José Lindomar Costa, o programa irá diagnosticar como está a situação do profissional da segurança pública e ajudar a criar medidas para auxiliar no controle do estresse.

Para o comandante-geral da PM, coronel Campos Filho, a profissão de policial é desgastante. "Para nós que lidamos com segurança esse programa é bom. Nosso trabalho é lidar com situações tensas e conhecer técnicas de controle do estresse auxiliará a lidar com isso", ressalta Campos Filho.

O comandante do 3º Batalhão do Grande CPA e bairros adjacentes, tenente-coronel da PM, Joselito do Espírito Santo de Paula, relata que já passou por momentos na carreira de exaustão e esgotamento físico. "A gente recebe uma pressão muito grande. Eu, por exemplo, gosto de me desligar de tudo no final de semana", conta.

Carência de efetivo e sobrecarga no trabalho

A carência de efetivo é outro fator que pode acarretar uma sobrecarga excessiva de trabalho que traz problemas à saúde. Na Polícia Judiciária Civil, por exemplo, o decreto nº 8.198 de 11 de outubro de 2006, que dispõe sobre o lotacionograma, prevê muito mais profissionais do que os que estão na ativa.

O instrumento serve para informar como estão ou como poderiam estar distribuídos os funcionários de uma empresa ou instituição, em cargos e funções. No caso da Polícia Civil de Mato Grosso foi feito um estudo na época da criação do decreto que mostrava qual era a quantidade necessária de policiais civis no estado naquele ano.

Segundo o presidente do sindicato dos delegados de Polícia Civil de Mato Grosso (Sindepol), Dirceu Lino, a quantidade de investigadores e escrivãos trabalhando é abaixo de 50% do previsto por lei.

"O decreto é de 2006, a demanda do estado cresceu nesses três anos e estamos longe do ideal que foi colocado. Hoje, temos mais de 30 delegados que deveriam se aposentar, mas não podem. Mesmo com o concurso, a quantidade de vagas não conseguirá atingir o que foi estipulado em 2006", diz Lino.

Para ele, a falta de profissionais agrava o quadro de estresse. "Existe delegado que é responsável por seis delegacias em algumas cidades do interior de Mato Grosso. Como esse profissional fica psicologicamente com uma responsabilidade dessas? A Polícia Militar também está defasada, mas está mais próxima do ideal", afirma Dirceu Lino.

Policiais utilizam droga como forma de alívio do estresse

O uso de drogas lícitas ou ilícitas como forma de alívio do estresse foi constatado no estudo "O uso de substâncias psicoativas na Polícia Civil de Mato Grosso", de Maria Helena dos Santos, psicóloga da Polícia Judiciária Civil de Mato Grosso. Durante a pesquisa foram entrevistados 10 investigadores atendidos pela Área de Acompanhamento Psicossocial entre janeiro de 2006 e março de 2007, num universo de 45 indivíduos. Os participantes são todos homens com mais de 10 anos de profissão.

De acordo com a pesquisa, 70% dos profissionais entrevistados responderam que faziam uso de substâncias psicoativas para o alívio das tensões ou sofrimentos. Todos estavam no exercício da função e fazendo uso das drogas há mais de 10 anos, caracterizando uso crônico. O álcool e o tabaco eram as drogas mais consumidas, seguidas da cocaína e seus derivados, podendo ocorrer o uso de mais de um tipo de droga.

"Os policiais trabalham muito acima do ideal, o que produz o estresse. O policial precisa cuidar da sociedade, mas não é olhado com atenção e não é tratado. O nível de estresse é grande", ressalta a psicóloga.

Maria Helena ressalta a importância da realização do Programa de Prevenção e Gerenciamento do Estresse para que os governantes se conscientizem da necessidade de prestar assistência ao profissional da segurança pública. A pesquisa está disponível para consulta pública.na biblioteca da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT).

Agentes carcerários estão fora da pesquisa

Os agentes carcerários, por estarem ligados ao Ministério da Justiça e não à Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp), não estão incluídos no programa. Para a primeira secretária do Sindicato dos Investigadores e Agentes Carcerários, Jacira Maria da Costa Silva, é ruim que os profissionais que atuam no sistema prisional não estejam participando da pesquisa. "Iremos solicitar na 1º Conferência Nacional de Segurança Pública que o Ministério da Justiça também realize uma pesquisa com os profissionais do sistema prisional, pois não temos nenhum dado sobre o estresse na profissão", disse Jacira Silva.

Ela destacou que o agente carcerário também é acometido de estresse como os outros profissionais da segurança pública. "O agente tem um turno de trabalho de 24 horas ininterrupto. Eles não podem descansar, devem estar alertas o tempo todo. Sem contar que o efetivo é insuficiente", desabafa Jacira.

Ela salientou que um dos pontos que serão defendidos pelos agentes carcerários durante a conferência é a aprovação da PEC 308/04 que prevê a transformação de agentes penitenciários em agentes penais, que teriam poder de polícia. Os profissionais iriam migrar do Ministério da Justiça para a Secretaria Nacional de Segurança Pública.

Texto produzido pela parceria portal Comunidade Segura e Fórum Brasileiro de Segurança Pública

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