quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Artigo: Manifestação do assistente técnico e a reforma do código de processo penal. Meio de prova atípico. Procedimento.

A reforma do Código de Processo Penal inseriu expressamente um novo meio de prova, qual seja, a manifestação do assistente técnico a respeito do material probatório que serviu de base à perícia. Trata-se da conclusão daquele técnico não oficial, indicado pelas partes.

Ocorre que o Código, apesar de tipificar o novo meio de prova, não indica qual procedimento deve ser respeitado quando da sua realização e introdução nos autos.

Para melhor clareza deste artigo, importante trazer alguns aspectos referentes à tipicidade do sistema probatório para, posteriormente, indicar uma proposta sobre o procedimento que deve ser respeitado quando da produção do meio de prova advindo da manifestação do assistente técnico.

Sobre a tipicidade probatória, um dos temas mais atuais e discutidos no processo penal brasileiro, alguns conceitos vêm sendo destacados pela doutrina.

Fontes de prova são as pessoas ou coisas pelos quais se podem obter elementos de prova. Exemplifica-se: documentos, objetos e testemunha(1).

Meios de prova se constituem na atividade através da qual se introduz um elemento de prova no processo. Exemplo: testemunho, confronto etc.(2)

Elementos de prova são os dados utilizados pelo juiz ao realizar a sua atividade inferencial. Exemplifica-se: declarações de testemunha, expressões contidas em documentos etc.(3) É com base nos elementos de prova que se desenvolve o processo intelectual do juiz e é formado o resultado da prova.

Assim, o resultado da prova somente será obtido se o juiz tiver em mãos elementos de prova, introduzidos através da realização de meios de prova.

Pode-se dizer que a manifestação técnica de experts se configura em meio de prova, que se assemelha à perícia oficial, por produzir dados no processo a serem analisados pelo juiz no momento da sua sentença.

Conforme Antonio Magalhães Gomes Filho: “Da mesma forma como ocorre em relação ao perito, o assistente técnico é pessoa dotada de conhecimentos técnicos, científicos ou artísticos, que traz ao processo informações especializadas, relacionadas ao objeto da perícia”(4).

Os meios de prova podem ser típicos e atípicos(5).

Apresentando um conceito ampliativo, são meios de prova típicos aqueles que são catalogados e regulados em lei, com a indicação de um procedimento para a sua realização. Meios de prova atípicos podem se constituir: 1. nos meios de prova não arrolados na lei, ou; 2. nos meios de prova apenas nominados pela norma, mas sem previsão de um procedimento.

No caso de meio de prova típico, em que há um procedimento expresso em lei, deve este ser respeitado, sob pena de nulidade. Não se pode criar outro procedimento, desrespeitando aquele disposto pela lei (o que levaria à irritualidade(6)) ou utilizar outro procedimento previsto na legislação para meio de prova diverso (o que levaria à anomalidade(7)).

A questão surge quando se trata de meio de prova atípico, ou seja, aquele meio de prova nominado(8) ou não pela lei, mas sem indicação do procedimento. É neste contexto que se encontra a manifestação do assistente técnico, pela nova sistemática processual penal brasileira.

Com efeito, o § 3º do novo artigo 159 faculta às partes a indicação de assistente técnico. Contudo, o único dispositivo legal que regulamenta esta nova figura é o parágrafo subseqüente do mesmo artigo, segundo o qual o juiz deverá declarar a admissão do assistente técnico no bojo do processo mediante decisão a ser prolatada após a conclusão dos exames e elaboração do laudo pelos peritos oficiais.

Ante o exposto, concluímos que não foi estabelecido procedimento a ser observado no desenvolvimento da atividade do assistente técnico, o que nos leva à indagação acerca de qual procedimento deve ser respeitado para a produção desse meio de prova.

Nos casos em que o assistente técnico se valer do material utilizado pelo perito e refizer exames específicos, estaremos de diante de um meio de prova(9), porquanto se objetiva trazer aos autos novos elementos probatórios. Nesse caso, estaríamos diante de um meio de prova atípico já que, apesar de nominado, não dispõe de um procedimento previsto em lei.

Nestas situações, a doutrina orienta que, para a realização do meio de prova apenas nominado, utilize-se do procedimento previsto em lei para um meio de prova análogo.

Considerando a grande semelhança desta figura com aquela do perito, e a disposição topográfica dos preceitos legais que tratam de ambas, chegamos à conclusão de que as regras sobre o procedimento a ser aplicado para a perícia devem ser aplicadas analogamente à assistência técnica. Assim, estará solucionado o dilema acerca do procedimento a ser respeitado quando da produção deste novo meio de prova, porquanto passará a ser previsto sem procedimento próprio, mas com procedimento legal apto à aplicação.

Do mesmo modo que as perícias, quando indicado um assistente técnico por uma das partes, devem ser dadas oportunidades a ambas as partes para que apresentem seus quesitos, bem como, será permitido à parte que indicou o assistente técnico requerer a oitiva deste na audiência para esclarecimento da prova ou resposta a quesitos, desde que o mandado de intimação e os quesitos ou questões a serem esclarecidos sejam encaminhados a ele que, se preferir, poderá apresentar suas respostas em laudo complementar (artigo 159, §§ 3º e 5º, do CPP).

Notas

(1) LARONGA, Antonio. Le Prove Atipiche nel Proceso Penal. Editora CEDAM, 2002.

(2) LARONGA, Antonio. Le Prove Atipiche nel Proceso Penal. Editora CEDAM, 2002.

(3) LARONGA, Antonio. Le Prove Atipiche nel Proceso Penal. Editora CEDAM, 2002.

(4) GOMES FILHO, Antonio Magalhães. As Reformas no Processo Penal. Coordenação: Maria Thereza Rocha de Assis Moura. Editora Revista dos Tribunais, 2008, p. 278.

(5) TONINI, Paolo. A Prova no Processo Penal Italiano, Editora Revista dos Tribunais. FERNANDES, Antonio Scarance. “Prova e Sucedâneo da prova no processo penal”, Revista Brasileira de Ciências Criminais nº 66.

(6) GOMES FILHO, Antonio Magalhães e BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Prova e Sucedâneos da Prova no Processo Penal Brasileiro. DEZEM, Guilherme Madeira. Da Prova Penal. Tipo Processual, Provas Típicas e Atípicas. Editora Millenium, 2008, p. 155.

(7) GOMES FILHO, Antonio Magalhães e BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Prova e Sucedâneos da Prova no Processo Penal Brasileiro. DEZEM, Guilherme Madeira. Da Prova Penal. Tipo Processual, Provas Típicas e Atípicas. Editora Millenium, 2008, p. 155.

(8) DEZEM, Guilherme Madeira. Da Prova Penal. Tipo Processual, Provas Típicas e Atípicas. Editora Millenium, 2008, p. 155. O autor define prova nominada como sendo “aquela que se encontra prevista em lei, com ou sem procedimento probatório previsto. Há, aqui, apenas a previsão do nomen juris do meio de prova”.

(9) Já no caso em que o assistente técnico apenas emite uma opinião valorativa acerca de elementos já contidos no processo, não podemos falar em meio de prova. No que se refere à assistência técnica consistente em mera opinião de especialista sobre elementos de prova do processo, algo que sempre foi utilizado no processo penal brasileiro, sobretudo quando se trata da opinião de juristas de renome, não há razão para se alterar a prática.


Fernanda Regina Vilares, Procuradora da Fazenda Nacional, mestranda em Direito Processual Penal pela USP.

Mariângela Lopes, Advogada, mestre e doutoranda em Direito Processual Penal pela USP.

Boletim IBCCRIM nº 194 - Janeiro / 2009

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