sábado, 29 de novembro de 2008

'Pobre não tem justiça', dizem condenados em Guarulhos

enato Correia de Brito, Wagner Conceição da Silva e William César de Brito Silva falam com exclusividade.

SÃO PAULO - Condenados por 4 votos a três pela morte de Vanessa Freitas, 22 anos, violentada e assassinada em agosto de 2006, Renato Correia de Brito, 24 anos, Wagner Conceição da Silva, 25, e William César de Brito Silva, 28 anos, não acreditam mais na justiça. Em entrevista exclusiva concedida ontem ao JT, no Centro de Detenção Provisória 1 (CDP) de Guarulhos, os rapazes afirmaram que que se tivessem sobrenome importante e poder aquisitivo não estariam presos.

Eles citaram como exemplo o caso do promotor Thales Ferri Schoedl, absolvido por 23 votos a zero das acusações de homicídio e tentativa de homicídio. Apesar de ter recebido uma pena inferior em relação aos outros dois acusados, William, condenado a 9 anos e 4 meses, era o mais indignado e emocionado. Ele chorou muito. Renato, condenado a 24 anos e 4 meses, assim como Wagner, ficou a maior parte do tempo cabisbaixo e foi o que menos falou à reportagem.



Os três contaram sobre os planos que tinham feito com suas famílias, quando foram soltos em 3 de setembro, após dois anos e 15 dias de prisão, após Leandro Basílio Rodrigues, o chamado ‘Maníaco de Guarulhos’, ter confessado o crime – depois recuou. Eles reclamaram da mudança de promotor às vésperas do julgamento; falaram da decepção sofrida instantes após a leitura da sentença no Tribunal do Júri; da expectativa de receber, hoje, os familiares no primeiro dia de visita desde a condenação; da rotina na cadeia e da tristeza de passar o terceiro Natal consecutivo atrás das grades. Leia a entrevista:



Como vocês viram a decisão do Tribunal do Júri?



William: Para mim foi uma injustiça. Sempre fomos uma família humilde. Sempre trabalhamos e lutamos. Durante dois anos falamos a verdade. Enquanto isso, a gente vê tanta injustiça. Começando pelo promotor (Thales). Falou que deu 12 tiros em legítima defesa e foi absolvido. Numa audiência em que estava o Leandro Basílio, eu conversei com o juiz (Leandro Jorge Bittencourt Cano) e falei que não me sentia um cidadão, porque não tinha sido absolvido. Só vou ser cidadão a partir do momento que eu não tiver matrícula (número do preso).



O que vocês acharam da atitude do promotor Marcelo Oliveira, que denunciou os três, depois voltou atrás, mas desistiu do júri às vésperas do julgamento?



William: Foi um absurdo. Se ele falou sobre a absolvição foi porque ele tinha não só a convicção, mas a certeza do que tinha falado. Pra depois aparecer outro promotor? Se eu tivesse poder aquisitivo, se eu fosse alguém como uma autoridade, não estaria preso.



Wagner: Na verdade foi comprado. Para livrar a cara de muitos que estão por trás disso.



Quando vocês foram soltos fizeram planos para o futuro?



Wagner: Eu tentava reconstruir minha vida com meu pai e minha mulher do meu lado e cuidar da minha mãe. Só que depois de 26 dias, perdi meu pai. Com três dias, dei entrada do meu pai no hospital. Depois de 23 dias ele morreu. O médico falou que ele morreu de depressão. Tudo que aconteceu nesses dois anos. Ele sabia que o filho dele estava injustamente preso e não podia fazer nada. A justiça é cega para quem é pobre. Quem tem dinheiro compra tudo. Quem não tem, vai parar atrás das grades, mesmo sendo inocente. Essa é a verdadeira justiça do Brasil.



Renato: Eles já falaram tudo. Se a gente tivesse dinheiro, tivesse nome, um sobrenome, não estaria passando por isso. Foi erro do Estado. É mais fácil jogar a gente, que não é ninguém, atrás das grades.



Como foi o retorno de vocês à prisão?



Wagner: Aqui pelo menos eles (presos) acreditam na verdade. Eles acompanharam tudo pela televisão. Sabem que nós estamos falando a verdade. Se nós fôssemos culpados, não estaríamos aqui hoje falando com vocês. Nunca fomos ameaçados. Estamos no convívio normal.



William: Mas o que me deixa mais revoltado é estar aqui novamente. A gente sempre trabalhou na vida. Cada porta de ferro que eu passo aqui, para mim é uma humilhação.



Vocês acreditam que terão outro julgamento?



Wagner: Eu sinceramente não acredito na justiça. Até agora estou vendo injustiça. Eles não procuraram consertar o erro deles. Estão persistindo no erro por muito tempo, há dois anos. Mas tenho esperança num novo julgamento. O advogado está correndo atrás.



William: Foi um erro duplo da justiça. Eles não foram atrás para achar o verdadeiro culpado. E no julgamento teve testemunhas que caíram de pára-quedas. Deram falso testemunho. Será que essas pessoas têm filho, tem família?



Você, Renato, acompanhou as declarações dos pais da Vanessa após o julgamento? Eles disseram que foi feito justiça.



Não, não. Fui direto para a prisão. Eu acho que eles deveriam procurar saber mais. Quem fez (matou Vanessa) está na rua e quem não fez nada está preso.



Vocês foram torturados no dia da prisão? Dá para contar como isso ocorreu?



William: Eu me encontrava trabalhando, fazendo meu serviço, propaganda sonora. No dia 19 de agosto de 2006, por volta das 10h, me ligaram se passando por cliente, um tal de Ricardo. Disse que estava na Rua Cachoeira. De repente, um monte de viatura entra de frente no meu carro. Eram três policiais militares e um civil. Falaram que eu estava sendo preso. Era umas 10h15. Mas só cheguei à delegacia às 16h40, 16h45 mais ou menos. Eles me levaram para o Cabuçu. Me agrediram, me bateram. Pisaram na minha cabeça e esfregaram minha cara no chão de terra.



E na chegada à delegacia?



William: O delegado me colocou na sala dele, onde já estava o Renato. Perguntei por que estava sendo acusado. Ele disse que o Renato era o mandante e que eu era o autor do crime. Depois de poucas horas, o delegado falou para um policial "tira esse lixo daqui". O policial me deu tapa na cara. Fui colocado de joelho e apanhei mais. Na carceragem encontrei o Wagner.



Vocês acham que o Leandro Basílio Rodrigues (chamado pela polícia de Maníaco de Guarulhos), que confessou ter matado Vanessa e voltou atrás, é o autor do crime?



William: Quem tem que investigar são eles (policiais).



Wagner: Eles têm a obrigação de investigar e não ficar condenando pessoas inocentes.



O que aconteceu depois da leitura da sentença. Como os PMs que o levaram à delegacia reagiram?



Willian: Apareceu um oficial e chamou a gente. Mandou a gente subir. No trajeto para a delegacia, um sargento da PM ligou e falou "estou aqui olhando para os três sendo presos". Ele sorriu.



Vocês foram condenados por um crime hediondo, que a população carcerária não perdoa, principalmente o crime organizado, o Primeiro Comando da Capital (PCC). Como é o dia-a-dia de vocês na cadeia?



Wagner: Fomos bem recebidos. Eles falaram "podem ficar sossegados que nós acreditamos na inocência de vocês, estamos vendo a injustiça que estão cometendo com vocês". Em nenhum momento teve represália.



William: Eu estou no raio 3, na mesma cela do Wagner. Cabem 12, mas tem 36.



Renato: Eu estou no mesmo raio deles. Mas em outra cela com 46 presos. A gente só vê céu e grade. A cela é aberta às 9h e fechada às 17h.



Wagner: É o dia inteiro sem fazer nada. E o mais triste é passar o terceiro Natal na cadeia, atrás das grades.



Vocês acreditam que a condenação dos três foi um dos maiores erros do Judiciário?



William: Com certeza, o maior erro do judiciário.



Cronologia do caso

19/8/2006: Renato Correia de Brito, Willian César de Brito Silva e Wagner Conceição da Silva são presos, acusados da morte de Vanessa Batista de Freitas, na noite anterior. Eles teriam confessado sob tortura

29/8/2008: Leandro Basílio Rodrigues, chamado pela polícia de Maníaco de Guarulhos, confessa o assassinato de Vanessa. Renato, Willian e Wagner são soltos cinco dias depois

18/9/2008: Rodrigues diz ao juiz Jayme Garcia dos Santos que confessou a morte de Vanessa sob tortura. Família da vítima crê que Renato, Willian e Wagner são culpados

Entenda os detalhes do caso

Ministério Público

O promotor Marcelo Alexandre de Oliveira fez a denúncia à Justiça e pediu a soltura dos acusados. Afastou-se do caso por acreditar na inocência dos réus

Polícia Civil de Guarulhos

- Delegado plantonista do 1.º DP, Paulo Roberto Poli Martins trabalhava no dia em que os três foram presos pela PM. Ele nega que os tenha torturado

Estadão.


Como pode, concordo em gênero e grau com eles...Pobre nunca tem vez e nunca terá...justiça para pobre não existe...o sistema penal só se volta quase que exclusivamente para o pobre...o detentor de poder e capital está fora do sistema pena....isto é um absurdo sem tamanho....

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