quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Artigo: Direito a dignidade

Li a notícia há uns 15 dias e não me sai da cabeça. Quando algo me impressiona deste modo, é o momento de compartilhar com outras pessoas, o que faço por meio deste texto.

A decisão de recusa do transplante de coração por Hannah Jones, inglesa, 13 anos, faz repensar a vida. O desejo da garota, de morrer com dignidade, foi respeitado pelos pais e consentido pelo Reino Unido, através de uma conselheira determinada pela Justiça, que considerou pertinentes os argumentos de Hannah. Caso contrário, poderiam forçá-la ao tratamento.

Tento me colocar no papel de Hannah, porém não consigo parar de pensar na mãe da garota. A maternidade nos torna solidárias. A mãe é ex-enfermeira de UTI e acompanhou a debilidade física da filha desde bebê: só aprendeu a caminhar ao três anos, um ano depois foi diagnosticada a leucemia mielóide aguda. A quimioterapia gerou o problema cardíaco. A infância foi vivida mais em hospitais do que em casa. A mãe acompanhou e, certamente, sofreu cada dor ao lado da filha, o que faz com que entenda o desejo da menina em não aceitar o transplante.

Deve ser doloroso para a família respeitar a decisão de Hannah. O respeito está entrelaçado ao amor. Se os pais entendem e respeitam a menina, é porque a amam sobretudo, embora esta pareça uma conclusão incoerente.

O desejo de ir para casa acompanha pacientes de qualquer hospital, por melhor que seja o tratamento recebido, por mais equipado que seja o quarto, nunca é como estar em casa. As palavras da adolescente inglesa foram contundentes: “Não quero um coração novo. Quero ir para casa”. Após tanto tempo em hospitais, ela quer a sua casa. Tem consciência da gravidade da doença e do pouco tempo de vida que lhe resta: “Tento não pensar na morte, mas sei que o meu tempo é limitado. Vivo cada dia. É difícil não sentir que a vida é injusta. Mas estou determinada a fazer o melhor”.

Lembrei de Ramón Sampedro, cuja história foi narrada no filme Mar Adentro. Um espanhol que ficou tetraplégico aos 26 anos e lutou por cinco anos na Justiça pelo direito de morrer. Vale a pena assistir ao filme! Embora seja doloroso pensar que não se trata de ficção. O personagem interpretado por Javier Bardem (em uma atuação brilhante, como sempre) existiu. Sempre se fala sobre direito à vida, porém o direito à morte também deve ser respeitado. Não falo aqui de suicídio, a situação é muito diferente!

Hannah Jones, mais do que ninguém, sabe o que é viver. E que a gente aprenda a lição: nada de se queixar da vida!


Joselma Noal, Escritora.

Zero Hora.

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