terça-feira, 14 de outubro de 2008

Se réu sabe dos riscos, responde por homicídio doloso

A Justiça de Goiânia considerou que um cabeleireiro que aplicou silicone industrial em um travesti vai responder por homicídio doloso. De acordo com o juiz Jesseir Coelho de Alcântara, da 1ª Vara Criminal de Goiânia, houve dolo eventual. Isso quer dizer que, para o juiz, não houve a intenção direta de matar, mas houve dolo porque o acusado conhecia os riscos envolvidos e, mesmo assim, resolveu aplicar o silicone. O acusado será levado para o Tribunal do Júri.

Em recentes decisões, o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal têm alargado os casos em que se aplica a noção de dolo eventual. O STF tem entendimento de que motoristas que causam mortes em rachas — corridas ilegais em vias públicas — devem ser julgados por júri popular. O STJ já tipificou como dolo eventual um caso em que o motorista estava a 165 km/h em uma ponte cujo limite de velocidade permitida era de 70km/h.

De acordo com os autos, o procedimento feito pelo cabeleireiro Emanoel Gomes de Andrade somente poderia ser feito por um médico com especialização em cirurgia plástica. O fato ocorreu em 6 de julho de 2003, na residência da vítima, Giovane Antônio Pires de Paula.

De acordo com denúncia do Ministério Público, Paula queria modelar seu corpo para torná-lo mais feminino, mas, como não tinha dinheiro para procurar um médico, vendeu um videocassete para Andrade, que então adquiriu dois litros de silicone de uso industrial, utilizado normalmente na fabricação de peças de fibra de vidro. No dia do fato, o acusado foi até o barracão onde a vítima morava e aplicou-lhe os dois litros de silicone nas pernas, em procedimento que durou cerca de três horas.

Duas horas depois das aplicações, Paula acordou com febre e tomou analgésicos. Com a persistência da febre, ligou para Andrade que informou para a vítima que “isso era normal e que poderia continuar durante todo o resto do dia”. Paula acabou morrendo de insuficiência respiratória causada por embolia pulmonar e edema agudo do pulmão.

De acordo com os autos, ao saber dos fatos, o réu fugiu. Posteriormente, ao ser detido, negou qualquer relação com o fato, admitindo apenas que “é costume entre os travestis a aplicação de silicones um no outro”. Em juízo, o réu afirmou que já aplicou 10 litros de silicone em seu corpo e em vários outros travestis e nunca ocorreu qualquer problema. No entanto, segundo o juiz, há indícios nos autos de que Andrade já chegou a causar lesões corporais e até uma morte, além da de Paula, com a aplicação de silicones em outros travestis.

Revista Consultor Jurídico, 14 de outubro de 2008

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