quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Juiz não é obrigado a receber advogado, diz Apamagis

Não receber advogado em gabinete é regra aplicada em todas as nações livres. A tese é levantada pela Associação Paulista de Magistrados (Apamagis), que emitiu nota a favor do desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo Ferraz de Arruda. Ele terá de se explicar ao Conselho Nacional de Justiça porque escreveu artigo na revista Consultor Jurídico em que afirma não receber advogados em seu gabinete. O pedido foi feito ao CNJ pela Associação dos Advogados de São Paulo (Aasp).

No texto, Ferraz de Arruda diz: “Devoto profundo respeito pela nobre e valorosa classe dos advogados, mesmo porque fui advogado, mas não os recebo em meu gabinete para tratar de processos que me estão conclusos” — Clique aqui para ler o artigo.

A nota da Apamagis afirma ser “preocupante o fato de que uma autoridade possa ser acusada por uma entidade que congrega advogados unicamente por exercer um dos mais legítimos direitos constitucionais assegurados ao cidadão: a da livre expressão do pensamento. O mais grave desse episódio é que tudo esteja sendo feito sob o pretexto da defesa de prerrogativas da advocacia”.

“Um Estado verdadeiramente democrático depende de julgadores preparados, com força para que suas decisões sejam cumpridas e, principalmente, capazes de exercitar o livre convencimento, diante de parâmetros constitucionalmente delimitados. A tese levantada pelo desembargador Ferraz de Arruda de recepção conjunta dos advogados das partes, além de bem fundamentada e condizente com o ordenamento jurídico nacional, é aplicada em várias nações livres do mundo, como, por exemplo, os Estados Unidos da América”, afirma a associação.

Como noticiou a revista Consultor Jurídico, o CNJ decidiu, por oito votos a um, que o desembargador tem de ser chamado para dar satisfação à Corregedoria Nacional de Justiça sobre o que escreveu. A opinião que predominou foi a de que o desembargador defende um ato que fere a Loman e o Estatuto da Advocacia.

No artigo, o desembargador defende que o gabinete de um juiz não é um espaço público de livre acesso e ataca o que chama de lobby de magistrados aposentados que se tornam advogados e passam a atuar onde antes julgavam. As críticas, contudo, não provocaram reações. Foi o fato de escrever que não recebe advogados em seu gabinete que fez o CNJ admitir a Reclamação Disciplinar.

O conselheiro Técio Lins e Silva considerou o artigo “um deboche”. “O desembargador pode escrever o que quiser, mas têm de responder por isso”, disse Técio. O relator do pedido, juiz Antonio Humberto, considerou o pedido juridicamente inviável e determinou seu arquivamento. A Aasp recorreu. Na terça-feira (21/10), o plenário do CNJ decidiu transformar o Pedido de Providências em Reclamação Disciplinar e encaminhá-la à Corregedoria Nacional.

Leia a nota pública

A APAMAGIS — Associação Paulista de Magistrados — vem a público externar com grande preocupação o procedimento disciplinar instaurado contra o Desembargador AUGUSTO FRANCISCO MOTA FERRAZ DE ARRUDA no CNJ - Conselho Nacional de Justiça, por provocação da AASP - Associação dos Advogados de São Paulo.

Em síntese, o caso versa sobre artigo publicado no blog Justiça Crítica, em que o Desembargador Ferraz de Arruda expressa sua posição pessoal sobre a recepção de advogados das partes, afirmando que, segundo sua convicção, “o Estatuto dos Advogados não pode legislar sobre normas de caráter nitidamente processuais, sendo por demais certo que os respectivos Códigos de Processos Civil e Penal estabelecem regras específicas e claras para o juiz, em que, numa situação de urgência, está obrigado a receber o advogado e despachar petição”. Em outro trecho, o Desembargador Ferraz de Arruda é ainda mais claro “há a inconstitucionalidade flagrante do artigo 7º, VIII, da Lei 8.906/94 (Estatuto da Advocacia), ao declarar como direito do advogado, ‘dirigir-se diretamente aos magistrados nas salas e gabinetes de trabalho, independentemente de horário previamente marcado ou outra condição, observando-se a ordem de chegada’”.

Desse modo, é preocupante o fato de que uma autoridade possa ser acusada por uma entidade que congrega advogados unicamente por exercer um dos mais legítimos direitos constitucionais assegurados ao cidadão: a da livre expressão do pensamento. O mais grave desse episódio é que tudo esteja sendo feito sob o pretexto da defesa de prerrogativas da advocacia.

É por isso que o caso vertente salta de um julgamento isolado para assumir contornos de importante precedente. Um Estado verdadeiramente democrático depende de julgadores preparados, com força para que suas decisões sejam cumpridas e, principalmente, capazes de exercitar o livre convencimento, diante de parâmetros constitucionalmente delimitados.

A tese levantada pelo Desembargador Ferraz de Arruda de recepção conjunta dos advogados das partes, além de bem fundamentada e condizente com o ordenamento jurídico nacional, é aplicada em várias nações livres do mundo, como, por exemplo, os Estados Unidos da América.

Também provoca estranheza as seguidas tentativas de manietar o Judiciário, tentando menoscabar a atividade do Magistrado com limites absolutamente descompassados da realidade. Nesse caso específico, há ainda outro gravame, em virtude do agente provocador ser uma entidade de classe de essencial importância para as liberdades públicas, a qual pretende por via transversa restabelecer a censura de opinião no âmbito do Poder Judiciário através do CNJ.

A APAMAGIS empreenderá todos os esforços possíveis para que os Magistrados possam continuar exercitando, com toda a amplitude, os direitos e deveres que lhe são assegurados e, assim, a aplicar a verdadeira Justiça.
Henrique Nelson Calandra — Presidente

Paulo Dimas de Bellis Mascaretti — 1º Vice-Presidente

Roque Antonio Mesquita de Oliveira — 2º Vice-Presidente

Revista Consultor Jurídico, 28 de outubro de 2008

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