quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Artigo: Mulheres no poder

Não basta evitar a discriminação contra as mulheres para dar cumprimento ao princípio constitucional de igualdade entre os sexos. Embora a omissão possa minimizar os problemas gerados pelo preconceito, as condutas afirmativas são imprescindíveis e devem ser aplicadas sob a forma de políticas públicas. Caso contrário, a igualdade não existirá tão cedo.

Conforme dados das Nações Unidas, mantendo-se o ritmo atual de crescimento da participação feminina nas instâncias de poder (que aumenta cerca de 1 a 2% ao ano) só haverá paridade de participação entre homens e mulheres daqui a 400 anos. No Brasil, a representação feminina no Congresso evolui muito lentamente: em 1986 as mulheres ocupavam 4,5% da cadeiras contra 6,8% hoje, 10 anos depois.

Daí a importância da Lei 9.100/95, que estabelece cota mínima de 20% de mulheres nas listas de candidatos dos partidos políticos, para as eleições municipais de 1996. Há, ainda, dois projetos em tramitação no Congresso para incluir a cota mínima de mulheres no Código Eleitoral, tornando a medida permanente.

Na Câmara, o PL 783/95, da deputada Marta Suplicy (PT-SP) prevê a implicação da cota mínima de mulheres para 30%. No Senado, o PLS 322/95, da senadora Júnia Marise (PDT-MG), mantém o percentual de 20%. Ambos os projetos tornam válidas as cotas para todas as eleições proporcionais.

Houve quem questionasse a constitucionalidade da instituição de cotas para as mulheres, alegando ser a medida discriminatória, mas essa posição parece ser minoritária. Na verdade, discriminação é o que vem ocorrendo nos partidos, onde a ala feminina mal encontra espaço. As medidas assecuratórias da participação das mulheres pretendem, apenas e tão-somente, caminhar no sentido da igualdade, que é princípio constitucional de aplicação imediata e depende de ações afirmativas.

As Delegacias de Defesa da Mulher (DDMs), criadas no Brasil para adequar o atendimento dado às mulheres as mais elementares noções de justiça, provaram ser de extrema utilidade no combate à violência de gênero e tiveram o grande mérito de tornar visível uma espécie de agressão que anteriormente ficava circunscrita à esfera doméstica e, portanto, impune. Não faltou quem considerasse as DDMs "discriminatórias", clamando pela criação das Delegacias do Homem, mas essas poucas vozes caíram no esquecimento. Hoje, estuda-se a ampliação do sistema para o atendimento de outros setores vulneráveis da população, procurando-se sanar algumas discriminações que seriam intransponíveis sem as medidas afirmativas. As DDMs foram e são objeto de estudo e imitação em vários países que procuram garantir os direitos de suas mulheres.

Quanto às cotas, já estão instituídas na Argentina, por exemplo, desde 1991, e o percentual mínimo para as mulheres é de 30%. A medida provou eficácia: em 1990, a bancada feminina no Parlamento era de 7 cadeiras num total de 256; no mandato seguinte, já na vigência da lei de cotas, o número de mulheres eleitas subiu para 27 e nas últimas eleições chegou a 70.

A questão da participação equitativa de mulheres nas estruturas de poder é problema mundial. Dados da União Parlamentar, organismo ligado à ONU, informam que de 39.683 parlamentares no mundo, apenas 3.636 são mulheres, o que significa apenas 9.16%. Por isso, a IV Conferência Mundial de Mulher da ONU, realizada em setembro de 1995, recomendou expressamente aos países participantes e signatários da Plataforma de Ação a adoção de medidas que estimulem os partidos políticos a incorporar mulheres nas mesma proporções e nas mesmas categorias que os homens. É isso que o Brasil está tentando fazer através do trabalho das parlamentares Marta Suplicy e Junia Marise. Elas merecem a precisam do nosso apoio.

Luiza Nagib Eluf
Promotora de Justiça Criminal em São Paulo

ELUF, Luiza Nagib. Mulheres no poder. Boletim IBCCRIM. São Paulo, n.42, p. 08, jun. 1996.

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