segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Paraná tem 7,6 mil presos à espera de julgamento

Decisão do STF reacende discussões sobre presos provisórios. Em todo o país há 200 mil detentos que ainda não sabem qual será a pena a cumprir

Existem 7.590 presos paranaenses que ainda não foram a julgamento, ou seja, 22% dos 34,6 mil. No Brasil o quadro é mais assustador: 45% deles não sabem qual será a pena que terão de cumprir – ao todo são 440 mil e, desses, 200 mil estão presos preventivamente. Na última semana, a situação dos presos provisórios no Brasil voltou a ser discutida. O Supremo Tribunal Federal (STF) concedeu liberdade a nove integrantes da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) que estavam presos há quatro anos sem julgamento. A decisão foi revista e eles permanecem encarcerados, mas reacendeu o debate sobre os fatores que levam à demora na instrução processual e os riscos decorrentes dessa lentidão para a sociedade.

Não está previsto em lei quanto tempo uma pessoa pega em flagrante poderá ficar presa até o julgamento da ação, mas ensinamentos da doutrina e decisões dos tribunais têm entendido que 81 dias é o prazo legal, podendo aumentar em casos de crimes hediondos. “O ideal é que o processo esteja concluído entre 90 e 180 dias”, explica o professor da Faculdade de Direito da Unicuritiba e membro do conselho penitenciário do Paraná, Maurício Kuehne. O problema é que não há levantamento oficial que informe a relação de presos provisórios versus o tempo em que estão nas carceragens e penitenciárias. “Não se sabe como está o andamento do processo de cada um deles”, afirma o diretor-geral do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), Airton Michels. No Brasil, são 130 mil provisórios em penitenciárias e cerca de 70 mil em delegacias. No Paraná, 5 mil estão sob a custódia da Secretaria de Segurança Pública (Sesp) e 2.590 estão em penitenciárias. “A cadeia é o local próprio para o preso provisório, a penitenciária é para condenados definitivos. O que acontece é que muitas vezes a cadeia tem presos demais e, por isso, alguns que são considerados perigosos são levados em caráter excepcional para os presídios”, diz Kuehne.

A coordenadora do projeto OAB Cidadania, Lúcia Beloni Corrêa, que tem participado dos mutirões para tentar ajudar esses presos, afirma que, antes de questionar o tempo em que essas pessoas estão privadas da liberdade, é preciso saber se elas já tiveram acesso à defesa. “Grande parte tem dificuldade para conseguir um advogado”, diz. Ela tem uma lista de 270 presos, de quatro delegacias do Paraná, que estão sem defesa. “Estamos analisando os autos para tentar pedir a liberdade provisória deles”, comenta. A OAB Cidadania recebeu ainda, do Ministério Público, uma lista de 165 nomes de pessoas presas no Paraná que são réus primários e cometeram pequenos delitos. “Provavelmente a pena deles não passa de quatro anos ou ainda, após a sentença, poderão ficar em liberdade. Não há motivos para ficarem presos agora”, explica Lúcia.

A prisão preventiva ou processual serve para proteger a sociedade de pessoas consideradas perigosas, que podem fugir ou que foram presas em flagrante. Ela se tornou um problema, por outro lado, porque muitos presos não conseguem ter acesso à defesa e ainda ficam nas mãos da justiça que nem sempre é ágil para julgar a ação. O resultado pode ser um preso primário que, ao invés de estar reinserido na sociedade, muitas vezes acaba sendo cooptado por organizações criminosas e se afunda de vez no mundo da criminalidade. (Leia mais na próxima página).

A favor do preso

O vice-presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Cláudio Dell’Orto, lembra que o prazo processual pode ser usado como um instrumento a favor da defesa. “Advogados tentam fazer manobras para inviabilizar a localização das testemunhas, como réus em liberdade. Também esperam prescrever o prazo de 81 dias para que possam entrar com um pedido imediato de soltura”, diz. A demora atual, em muitos processos, também é provocada por dificuldades de se intimar citados e deslocar réus. “Quanto maior o número de audiências, mais complexa é a execução do trabalho pelo juiz. Por isso a AMB defende a unificação e simplificação do sistema processual para evitar o excesso de prazo.” Isso quer dizer que os prazos processuais, que hoje são diferentes, seriam os mesmos. A audiência seria feita de uma única vez, para ouvir todas as testemunhas, evitando os transtornos de transporte de presos e citados. Há, porém, outros juristas que não defendem a simplicação do processo, pois o que se julga é a liberdade de uma pessoa e isso deve ser analisado com calma.

Ranking

No ranking dos estados que mais têm presos provisórios em penitenciárias, São Paulo aparece no primeiro lugar: são 43.862 até junho deste ano. Maurício Kuehne, que já foi presidente do Depen, explica que São Paulo está em uma pior posição porque há uma concentração de presos na região de Presidente Prudente, distante 500 quilômetros da capital do estado, que precisam se deslocar para audiências na capital. Seis estados brasileiros – Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Pernambuco e Piauí – têm mais presos provisórios do que condenados, o que pode representar que há uma demora grande para o julgamento das ações, ou ainda, que os juízes têm absolvido mais do que condenado. “Minha preocupação não é diretamente com os provisórios, mas quantos deles serão absolvidos. Se depois de receber a sentença eles pegam penas alternativas, não deveriam ter ficado presos por mais de 100 dias, por exemplo. É preciso mais sensibilidade dos juízes e promotores”, afirma Airton Michels.

A Sesp foi procurada para comentar o que tem sido feito com os presos provisórios, mas pela assessoria de imprensa informou que não dá entrevistas sobre o assunto. A Defensoria Pública do Paraná também foi procurada para comentar a precariedade do serviço, mas até o fechamento desta edição ninguém retornou as ligações.


Fonte: Pollianna Milan - Gazeta do Povo

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