quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Artigo: Juizados Especiais Criminais: suspensão consensual do processo

A Lei dos Juizados Especiais Criminais, dentre outras significativas modificações legiferantes, atenuou o princípio da obrigatoriedade da ação penal, prevendo a suspensão consensual do processo. Assim, o Ministério Público, nas infrações cuja ação penal seja pública e a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano, abrangidas ou não por esta lei, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, que se aceita pelo acusado e homologada pelo juiz, suspenderá o processo por dois a quatro anos, submetendo o réu a determinadas condições.

A lei somente permite a suspensão consensual do processo, ou seja, o afastamento do processo através de oferecimento do Ministério Público e aceitação do acusado, homologados pelo Poder Judiciário, como forma de transação processual, autorizada por expressa disposição constitucional (art. 98, I) e com a conseqüência de atenuar os princípios da obrigatoriedade da ação penal, do devido processo legal, contraditório e ampla defesa.

O consenso é obrigatório e exigível constitucional e legalmente, pois a Constituição Federal prevê como direito do Estado o ius puniendi e o ius punitionis, ao possibilitar a aplicação de pena pela autoridade judicial competente, por crime definido em lei, através do devido processo legal, iniciado por denúncia do Ministério Público (art. 5ª, XXXIX, LIII, LVII e art. 129, I), que por força da Constituição (art. 129, I) detém a privatividade da ação penal pública. A suspensão da persecução penal, atenuando o princípio da obrigatoriedade, somente poderá ocorrer através da transação processual entre as partes, Ministério Público representando a sociedade e o acusado (art. 98, I, CF), não se constituindo, pois, direito subjetivo deste.

Comos salientamos em nosso livro "Juizado Especial Criminal - Aspectos Prático", ed. Atlas, em conjunto com os colegas Pazzaglini, Smanio e Vaggione, entendendo o promotor de Justiça não ser caso de formular a proposta, deverá fundamentar essa decisão (art. 129, VIII, última parte, da Constituição Federal, art. 43, III, da Lei nº 8.625/93). Caso o juiz entenda cabível a suspensão, perante denúncia sem proposta, deverá ser aplicado, subsidiariamente, o art. 28 do CPP, remetendo-se os autos ao procurador-geral de justiça, respeitando-se, plenamente a titularidade da ação penal pública, o direito ao contraditório e a paridade entre acusação e defesa ("par conditio").

Desta forma, a nova lei respeita o sistema acusatório, consagrado pelo legislador constituinte na área penal, dentro do respeito à teoria dos "freios e contrapesos" (checks and balances), onde existe separação orgânica entre o órgão acusador, e o órgão julgador, sendo a exclusividade da titularidade da ação penal pública e a possibilidade dela dispor, nos moldes legais, do Ministério Público, enquanto a função juridicional pertence ao Poder Judiciário, respeitando, "o mínimo irredutível de uma autêntica Constituição", que "teria de conter as regras da separação de poderes; um mecanismo de cooperação e controle desses poderes - cheks and balances -; um mecanismo para evitar bloqueios respectivos entre os diferentes detentores de funções do poder..." (Wheare, Karl C., Modern Constitucions, London, Oxford University Press, 1973, pág. 46 e ss).

Alexandre de Moraes
Promotor de Justiça da Capital, 1º secretário da Ass. Paulista do Ministério Público e prof. de Direito Constitucional e Penal do Curso MPM.

MORAES, Alexandre de. Juizados especiais criminais: suspensão consensual do processo. Boletim IBCCRIM. São Paulo, n.39, p. 07, mar. 1996.

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