quarta-feira, 23 de julho de 2008

Preso por R$ 10, foi solto graças à mãe

Servidora foi obrigada a mudar de cidade, mas recorreu pessoalmente ao STJ para obter o habeas corpus.

A funcionária pública Sueli Tadeu da Rosa, de 48 anos, precisou recorrer pessoalmente ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) para libertar o filho de 20 anos, preso havia quatro meses sob a acusação de roubar R$ 10. O rapaz é dependente químico e negou o crime, mas isso não impediu que a prisão fosse mantida tanto pela Justiça de Boituva, na região de Sorocaba, onde a família morava, quanto pelo Tribunal de Justiça de São Paulo. "Eu me sentia injustiçada, pois há tanto crime mais horrível e as pessoas ficam livres."

O STJ decidiu libertá-lo na quinta-feira. A mãe contou que o filho é viciado desde os 14 anos. Ele se tornou dependente e, por causa do vício, passou um período internado na antiga Febem, atual Fundação Casa. "Ficou marcado por causa disso e passou a ser perseguido principalmente pelos guardas municipais", alega Sueli.

Viúva, ela internou o filho várias vezes, mas não conseguiu tirá-lo das drogas. "Quem já passou por isso sabe do que estou falando: é a vida da gente que vai toda embora." Quando o rapaz foi preso, ele estava com outros dois dependentes químicos num ponto-de-venda de drogas. A mãe conta que o traficante não apareceu e eles decidiram ir comprar em outro local. "Estava de moto e com o dinheiro do outro. Como não tinha lugar para os três na moto, dois foram comprar e o que ficou decidiu acusá-los de roubo."

O filho de Sueli e o amigo foram presos pela Guarda Municipal. Autuado em flagrante por tráfico, ele foi levado para a Cadeia Pública de Itararé, na divisa com o Paraná, a mais de 200 km da cidade. "Só pude ir visitá-lo uma vez." Sueli contratou advogados, mas não conseguiu um habeas corpus. "Ele me disse que era inocente e acreditei. Decidi recorrer em Brasília."

A funcionária pública, que já trabalhou na área de saúde, exerce a função de escrevente judiciária. "Eu sabia que qualquer pessoa pode pedir justiça em nome de alguém da família." Com a ajuda da filha, passou a mandar cartas com cópias do processo ao tribunal. "Não entendo de lei, mas escrevi o que sentia e contei toda a verdade."

O presidente do STJ, ministro Humberto Gomes de Barros, considerou a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal para permitir a liberdade provisória do jovem, que é primário e tem residência fixa. O ministro destacou que o suposto crime - roubo de R$ 10 - não chega a agredir drasticamente os valores sociais, quanto mais considerando a dependência química.

Barros entendeu que a manutenção da prisão não foi fundamentada pelo TJ. O tribunal paulista havia negado liberdade por considerar que o reconhecimento da vítima e o depoimento dos policiais caracterizavam indícios da autoria do roubo. Entendeu-se, ainda, que era preciso "assegurar a ordem pública" por se tratar de "conduta delituosa que agride sobremaneira os valores cultuados pela sociedade".

Sueli considera o resultado uma vitória de quem acredita na Justiça. "Em nenhum momento eu pensei em desistir, mesmo sofrendo muita perseguição." Há dois meses, ela mudou de cidade. "Meu filho ficou marcado." Sueli, agora, pensa no outro rapaz que continua preso. "Ele também é inocente e espero que seja libertado."


Estadão.

Nenhum comentário:

Pesquisar este blog