sexta-feira, 25 de julho de 2008

No Rio, 92% de crianças em abrigo têm pais vivos

Primeiro levantamento completo da situação no Estado, feito pelo MP, revela que 54% dos internos estão longe da família há mais de um ano.

Após 18 anos de existência do Estatuto da Criança e do Adolescente, o Rio descobriu que tem 3.732 meninos de 0 a 17 anos distribuídos em 235 abrigos e que 92,12% têm mãe ou pai vivo. São constatações do primeiro Censo da População Infanto-Juvenil Abrigada do Estado do Rio, que vai ser divulgado hoje. Coordenado pelo Módulo da Criança e do Adolescente do Ministério Público Estadual, o censo foi realizado ao longo de um ano. "É um marco histórico. As autoridades agora podem trabalhar com dados concretos", comemora a promotora de Justiça Liana Barros, que coordenou os trabalhos.

Todas as crianças, seja as que estão em abrigos municipais ou ligados a fundações, estão num cadastro online que pode ser acessado por juízes, promotores e membros do Conselho Tutelar de cada cidade.

O censo mostrou que apenas 30,71% das crianças estão nos abrigos há menos de seis meses, considerado um tempo razoável de permanência; 54,58% estão há mais de um ano, sendo que 3,14% vivem longe da família há mais de dez anos.

Marcelo Garcia, secretário municipal de Ação Social, lamenta. "Não dá para comemorar quando uma criança completa dez anos num abrigo. Eu gostaria que ela ficasse 3 meses. Mas, infelizmente, a média nos abrigos municipais ainda é de 7 meses", diz Garcia, que acusou o governo federal. "Uma cidade como o Rio recebe apenas R$ 12 mil por mês de ajuda do governo federal para isso." Uma criança custa aos cofres da prefeitura de R$ 700 a R$ 1.200 por mês de acordo com o tamanho do abrigo.

O tempo excessivo de permanência não é o único problema. O processo de destituição do pátrio poder, que na prática significa que a criança está disponível para adoção, ainda é lento diante da quantidade de meninos que são levados diariamente para os abrigos. Apesar de 30% não receberem visitas de nenhum parente, ou seja, estarem totalmente à margem da família, só 6,68% estão disponíveis para adoção.

FALTA DE CRECHE

O censo apurou também os motivos que levam essas 3.732 crianças a serem afastadas da família. O maior fator é negligência dos pais (14,34%), seguido de falta de recursos materiais da família (12,78%) e abandono pelos responsáveis (11,68%). Vítimas de violência doméstica são 8,71%. "Os fatores estão relacionados. Há crianças que ficam em abrigos porque a mãe, geralmente empregada doméstica, não encontra creche para deixar o filho. Aos poucos, ela deixa de visitar nos fins de semana porque se convence que não tem condições de criar uma criança", conta Liana.

NO BRASIL

No último levantamento nacional, realizado em 2004 em 589 abrigos do País, foram verificados resultados semelhantes aos apresentados no estudo do Rio. Entre os 80 mil crianças e adolescentes pesquisados por técnicos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a maioria (86,7%) também tinha família e vivia em abrigos por causa da pobreza. As que tinham condições de serem adotadas eram minoria - 6% no Nordeste e 16,3% no Sul.

A maior parte, 52,6%, vivia nas instituições há mais de dois anos. Entre elas, 32,9% estavam nos abrigos por um período entre 2 e 5 anos e outros 6,4% há mais de 10 anos.

Os próprios autores do estudo, porém, admitem que as estatísticas já estão defasadas. "Foi um primeiro passo, mas é fato que está incompleto. Conseguimos mapear apenas os abrigos que recebem recursos do governo federal", explicou a coordenador do estudo, Enid Rocha.

"Quando iniciamos a pesquisa, tinhamos uma estimativa inicial de que o número de crianças e adolescentes que vivem em abrigos seria de mais de 500 mil e não se tem idéia do total de abrigos do País", disse outro pesquisador, o professor de Pedagogia da Universidade de São Paulo (USP) Roberto de Oliveira.


Estadão.

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