sexta-feira, 4 de julho de 2008

Mais polêmica em audiência na Câmara para discutir descriminalização do aborto

Brasília - Depois de uma polêmica audiência ontem (2), outra audiência para debater o Projeto de Lei 1.135/08, que descriminaliza o aborto no Brasil, foi realizada hoje (3), na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) da Câmara. E, outra vez, o debate foi marcado por controvérsias. Resultados práticos só devem aparecer na semana que vem, quando o parecer do relator, contrário à mudança, deve ser votado.

A mesa reuniu três representantes pró e três contra o projeto. Entre os favoráveis, Maria José Rosário Nunes, da organização Católicas pelo Direito de Decidir, e, do lado contrário, a ex-senadora Heloísa Helena. A audiência durou mais de quatro horas e também contou com a presença de militantes que colaboraram para aquecer o debate.

Maria José defendeu que “se é verdade que o aborto é abominável, mais ainda é a punição para a mulher que o pratica”. Também católica, só que do lado contrário da bancada, a professora de microbiologia Lenise Garcia rebateu dizendo que “a punição é a forma que a legislação encontrou de coibir os atos infracionais ou os crimes”, e completou falando que “quando a mulher aborta, o Código do Direito Canônico a descomunga da Igreja”.

Para o juiz de direito Roberto Arraiada Loréa, favorável ao projeto, o argumento não pode ser considerado porque o Código Canônico não pode prevalecer num estado laico, e sim, a Constituição Federal. Ele aproveitou para criticar a ausência de líderes de outras religiões que não sejam cristãs, pois a Constituição assegura a liberdade e autonomia religiosas.

Loréa colocou na internet uma resposta ao parecer do relator do projeto de lei, o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que antecipou seu voto, ontem, dizendo ser contrário ao projeto. O juiz classificou o parecer do relator como “imprestável juridicamente”. Cunha respondeu que “não debateria o conteúdo do parecer com os convidados, mas com os parlamentares, no momento da votação do PL”.

Já a professora Débora Diniz Rodrigues, representante do Instituto de Bioética, Direito Humano e Gênero, concentrou sua argumentação em uma pesquisa sobre aborto. Realizada nos últimos 20 anos, ela concluiu que as mulheres que abortam têm, em média, de 20 a 29 anos, o fazem na primeira gravidez, e a maioria é católica – seguida das espíritas. As duas religiões condenam a prática.

De acordo com os dados, uma mulher em cada 15 brasileiras já abortou, totalizando 3,7 milhões. A maioria começa o procedimento em casa – o mais comum é que as mulheres façam uso do medicamento abortivo Citotec, que tem venda proibida no Brasil – e termina sendo internada no Sistema Único de Saúde (SUS). Segundo Débora, todos os estudos apontam que “quando a mulher decide abortar, o decide como ato de responsabilidade produtiva”.

Última a debater, Heloísa Helena admitiu que as estatísticas são altas, mas defendeu que o projeto não pode levar apenas os números em consideração. “Se fosse assim, teríamos que regulamentar a ocupação de menor aprendiz para aqueles meninos que são aliciados pelo tráfico de drogas. Eles também são muitos e, nem por isso, devemos fazer isso”, argumentou.

Ela completou que também defende a autonomia da mulher sobre o próprio corpo, “se quiser ser perua ou punk, ou mesmo, se quiser se encher de plásticas, isso é decidir sobre o que faz com seu corpo”, o que não lhes dá o direito de decidir sobre o corpo do outro – no caso, o feto – que “está ligado ao corpo dela apenas por uma circunstância”.


Agência Brasil.

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