domingo, 6 de julho de 2008

Artigo: A volta do Direito Penal do Terror

Com certeza vivemos tempos difíceis em relação à aplicação efetiva do Direito Penal. O Estado Brasileiro hoje cria e aplica o Direito Penal para os inimigos, e não mais para os seus cidadãos.

Se por um lado assistimos atônitos as grandes operações da Polícia Federal, que mais parecem aqueles seriados de televisão dos anos 80, por outro percebemos, ainda sem compreender os motivos, a volta do Direito Penal do Terror contra o inimigo.

Caminhamos eliminando Direitos Fundamentais consagrados na nossa Carga Magna.

A edição da Lei n.º 11.705/08, que reforma o Código de Trânsito Brasileiro, apelidada de “Lei Seca”, traz algumas aberrações.

Observamos na mesma flagrante ilegalidade que poderá ser objeto de Ação junto ao Supremo Tribunal Federal para reconhecimento da sua inconstitucionalidade. Não queremos fazer aqui a apologia ao Crime. Ao contrário, buscamos a observância do Estado Democrático de Direito e do princípio da intervenção mínima do Direito Penal, o respeito dos Direitos Fundamentais. O Direito Penal parece a salvação da pátria quando as coisas em sociedade começam a degringolar. Se há um aumento significativo de acidentes de trânsito com vítimas fatais, logo alguém pensa em endurecer as Leis que regem o tema, a fim de colocar um fim na barbárie.

Se esquece o legislador que antes da edição de Leis é preciso se preocupar com a Educação. A punição pura e simples não trará os resultados necessários. A solução está na eficiência da aplicação da Lei e na Educação Preventiva de Trânsito. O novo artigo 165 do Código de Trânsito Brasileiro, que prevê multa administrativa para quem for pego dirigindo embriagado seja qual for a quantidade de álcool por litro de sangue, parece-nos um contra-senso e um despropósito, já que pa ra a consumação do crime previsto no artigo 306 do Código de Trânsito é necessário uma concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 (seis) decigramas. A multa pela infração administrativa do artigo 165 deveria estabelecer um índice de tolerância, que é exigido para a configuração do crime. Já o crime, elencado no novo diploma legal, só deveria estar descrito se o condutor ostentasse tal nível de álcool no sangue e desde que também expusesse a dano potencial a incolumidade pública, já que é esta a objetividade jurídica que se quer defender.

A outra aberração que notamos na Lei n.º 1.705/08 vem exposta no seu § 3.º do artigo 277, que indica que caso o condutor se recuse a se submeter a qualquer dos procedimentos previstos para a verificação da embriaguez, tais como: exame clínico (que pode ser feito pelo próprio policial na abordagem do condutor - art. 277, § 2.º do CTB), exame químico de dosagem alcoólica, bafômetro, o mesmo será multado e terá suspensa a sua habilitação por 12 (doze) meses. Tal disposição beira a ilegalidade e a inconstitucionalidade já que, por disposição da Constituição Brasileira, ninguém em processo judicial ou administrativa está obrigado a produzir prova contra si mesmo.

Outra falácia construída nesse novo comando legislativo, e que vem ao encontro do chamado direito Penal do Terror e contra o inimigo, bem como divulgado pela mídia, é o fato de que o motorista flagrado embriagado será preso. Ora, seja qual for a quantidade de álcool no sangue, o condutor será multado e, se esta quantidade exceder a 6 decigramas, será preso em flagrante pelo crime do artigo 306 do CTB, sendo liberado em seguida, posto que a pena mínima prevista é de 6 meses de detenção, portanto, apenamento que se enquadra dentro daqueles crimes em que o acusado é solto independentemente do pagamento de fiança.

O rigor da lei aliada as flagrantes ilegalidades do seu texto levarão ao questionamento da chamada “Lei Seca”, que poderá deixar de ser aplicada, em razão de suas próprias incongruências. O que vemos hoje em dia é que aqueles que devem aplicar a Lei pouco a conhecem, e quando conhecem verificam na prática que ela não funciona, tornando-a dentro no nosso arcabouço jurídico mais uma das Lei do chamado direito Penal do Terror.


Por Paulo José I. de Morais é advogado, graduado pela Universidade de São Paulo, pós graduado pela Universidade Clássica de Lisboa. Militante do Direito Penal. Mauricio Januzzi Santos é professor de Processo Penal da PUC/SP, mestre em Direito pela PUC/SP.


O Estado do Paraná, Direito e Justiça.

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