sábado, 12 de julho de 2008

Artigo: A lesão corporal desportiva

Toda e qualquer ofensa ou dano à integridade corporal ou à saúde de outrem configura, em tese, o delito de lesão corporal, estampado no artigo 129 do Código Penal.

Pode ser a lesão: dolosa - quando haja vontade consciente e livre de causar o dano ou a ofensa, ou culposa - quando o agente, embora não tenha querido produzí-la, acaba provocando-a por imprudência, negligência ou imperícia

Situação interessante do ponto de vista jurídico-penal é a lesão corporal nos esportes.

Em algumas práticas desportivas, os litigantes visam diretamente a violência contra o seu contendor. O contato corpóreo é sempre constante e o resultado da pugna é estabelecido pelo número de pontos obtido. É o caso do boxe, da luta libre, do judô.

De outra parte, essa violência pode decorrer, de forma indireta, das regras estatuídas para o tipo de esporte. Alinham-se aqui o futebol, o "handball", o basquete, o polo aquático, a esgrima e outros. Nesses esportes obedece-se às leis pré-estabelecidas; todavia, podem ocorrer ferimento em ou em vários protagonistas. O agente não visa lesionar diretamente o oponente com a violência, mas essa pode acontecer em função da atividade exercida.

Todos esses atos (quer sejam os da violência direta de um contra outro; quer seja indireta _ caso do futebol) enquanto regularmente praticados, atendo-se os contendores fielmente às normas estabelecidas para as modalidades esportivas, são considerados lícitos, vale dizer, sem importância para o Direito Penal.

Entretanto, na medida em que exista infringência a essas regras o assunto passa interessar sob o ponto de vista penal e inicia-se a ilicitude.

O primeiro ponto a ser analisado diz respeito ao consentimento do ofendido

O direito à integridade ou incolumidade é indisponível, tornando-se irrelevante, quase sempre o consentimento da vítima para tornar lícita a ação do agente.

No entanto, nas práticas desportivas, a tendência natural é considerar-se impunível o ato violento praticado contra a integridade física ou à saúde do outro, á que aquele que sofreu as lesões consentiu.

Porém, não é o consentimento que torna lícita a lesão ou dano produzido em disputas desportivas. Essa licitude decorre, necessariamente, do fato da prática desportiva estar de acordo com a ordem jurídica e ser reconhecida pelo Estado através de aprovação de leis, decretos, portarias, expedidas pelo Conselho Nacional de Desportos.

Em caso de violência decorrente da prática normal de esportes, ocorrerá o surgimento da excludente de criminalidade consubstanciada no artigo 23, inciso III, in fine, do Código Penal, qual seja, o exercício regular de direito.

É preciso que o direito seja regularmente exercido, devendo os protagonistas permanecer fielmente dentro dos estritos limites das normas de competição, pois, basta a infringência a essas regras e o delito de lesão corporal estará, em tese, sendo praticado pelo agente, e possivelmente, punido.

E para que ocorra a punição é necessária a existência de dolo ou culpa, elementos pertencentes ao tipo penal, os quais, se não aparecem, não há que se falar em tipicidade da conduta, não bastando o ardor natural dos litigantes ou um pequeno e explicável excesso.

Encaixam-se aqui exemplos como o do lutador de box, que durante a interrupção da luta pelo árbitro desfere golpes no contendor, causando-lhe ferimento. Isso, de forma tão clara, que, incontrastavelmente, violou as regras do box e praticou, em tese, o crime de lesão corporal, desde que tenha existido dolo ou culpa.

Portanto, comprovando-se a ilicitude com a transgressão das regras do jogo, tem-se a figura penal estatuída no artigo 129, "caput", ou a do parágrafo 6º do mesmo artigo do Código penal: lesão corporal dolosa ou lesão corporal culposa.


Por Carlos Aloysio Canellas de Godoy


GODOY, Carlos Aloysio Canellas de. A lesäo corporal desportiva. Boletim IBCCRIM. São Paulo, n.6, p. 01, jul. 1993.

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