quarta-feira, 25 de junho de 2008

A desigualdade diminui

Graças ao crescimento econômico, à elevação do salário mínimo e aos programas de ajuda aos pobres, a distribuição de renda vem se tornando menos desigual nas seis maiores áreas metropolitanas do Brasil, segundo estudo recém-divulgado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). O trabalho, contido em oito páginas de tabelas, gráficos e textos explicativos, é mais uma confirmação da tendência apontada por estudos mais amplos e mais minuciosos publicados por vários pesquisadores nos últimos dois anos. A partir de 2003, os mais pobres tiveram aumentos de renda maiores que aqueles conseguidos pelos trabalhadores das faixas mais altas nas áreas metropolitanas de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre, Salvador e Recife, de acordo com o informe distribuído na última segunda-feira.

Mais importante que a redução da desigualdade, em termos práticos, foi a redução da pobreza durante esse período. Com mais dinheiro, milhões de pessoas puderam consumir mais produtos e ter acesso a melhores condições de vida. As tabelas e gráficos mencionam explicitamente o rendimento das pessoas em suas ocupações principais, mas os números incluem, segundo explicações fornecidas pelo presidente do Ipea, benefícios previdenciários e transferências de renda por meio de programas sociais.

O trabalho não especifica o peso de cada fator, mas não é muito difícil entender o quadro. Dois componentes políticos são evidentes: o aumento do salário mínimo e a ampliação das transferências por meio do Programa Bolsa-Família. Também os principais fatores econômicos parecem claros: a expansão da economia criou empregos, estimulou a formalização dos contratos e permitiu a elevação dos salários nas faixas inferiores.

A valorização real dos salários, no entanto, só foi possível graças ao freio imposto à inflação pela política monetária. Se o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tivesse ouvido alguns conselheiros e aceitado a idéia de "um pouco mais de inflação para um pouco mais de crescimento", o poder de compra dos pobres teria crescido bem menos, se tivesse chegado a crescer. São eles, em geral, os mais prejudicados quando ocorre uma elevação geral e continuada de preços.

Segundo o estudo, o coeficiente de Gini, a medida mais comum do grau de distribuição de renda e de outros bens, passou de 0,543 no último trimestre de 2002 para 0,505 no primeiro de 2008, com uma redução de quase 7%, naquelas seis áreas metropolitanas.

Em âmbito nacional, um estudo mais amplo e mais minucioso divulgado no dia 12 de maio, também pelo Ipea, mostra uma queda de 0,594 em 2001 para 0,559 em 2006. Esse cálculo refere-se à renda domiciliar per capita em todo o País. O universo da pesquisa e os tipos de rendimento incluídos no cálculo são diferentes, mas a tendência apontada é claramente a mesma do trabalho distribuído nesta segunda-feira.

Apesar da inegável melhora, o padrão brasileiro de distribuição ainda é um dos piores do mundo. Segundo o estudo mais amplo, nesse ritmo o País precisará de mais 6 anos para alcançar o padrão mexicano e de 24 para chegar ao nível do Canadá.

Não tem sentido prático, no entanto, formular uma política tomando como objetivo um coeficiente de Gini considerado aceitável. A distribuição pode ser mais igualitária que a do Brasil tanto em economias avançadas quanto em sociedades muito pobres e pouco desenvolvidas. Políticas baseadas no desenvolvimento científico e tecnológico, na educação de qualidade e na criação de oportunidades eqüitativas de progresso pessoal podem produzir a melhor combinação de resultados. O Estado pode e deve desempenhar um papel fundamental na promoção da eqüidade, mas para isso tem de ir muito além das políticas de transferência direta de renda.

A redução da desigualdade é um resultado importante, mas insuficiente e instável. Só será um ganho consolidado, se os benefícios criados com as transferências de renda e com a elevação do salário mínimo forem acompanhados de novas políticas na direção correta. Se não se tornarem participantes produtivos da economia moderna, os trabalhadores pobres nunca deixarão de ser dependentes do Estado. Se a política econômica resvalar para o populismo e o País voltar à instabilidade, o valor real dos salários irá pelo ralo. O resto é fantasia.


Estadão.

Nenhum comentário:

Pesquisar este blog