terça-feira, 17 de junho de 2008

Artigo: 'Block-Out'

Bloqueios de estradas são crimes contra a segurança das comunicações, puníveis com prisão.

A situação gerada pela crise dos combustíveis, com ameaças de bloqueio por parte dos empresários de transporte, suscita a questão dos limites do direito de manifestação. Além disso, indicia um caso de ‘lock-out’, em que os patrões impedem os trabalhadores de exercer o seu direito ao trabalho.

A greve pode comprimir o normal exercício de direitos, mas a lei procura garantir que os direitos alheios não serão afectados no seu conteúdo essencial. Assim, as greves legais implicam a organização da sociedade, nomeadamente através de serviços mínimos, assegurados pelos próprios trabalhadores.

Já o exercício do direito de manifestação exige aviso prévio, para se providenciar a protecção dos próprios manifestantes e dos restantes cidadãos. É um direito estruturante da sociedade moderna, destinado a conceder aos eleitores um modo de expressão que excede o espaço da democracia representativa.

O ‘lock-out’ levado a cabo por empresários de transportes é ilegal. É expressamente proibido pela Constituição, porque impede o exercício do direito ao trabalho e excede os limites da iniciativa privada e do direito de propriedade. Na realidade, o ‘lock-out’ corresponde a uma forma de opressão social.

Em tempo de crise, o Direito Penal perde parte da sua eficácia preventiva, mas continua a desempenhar um papel essencial na protecção de direitos. Bloqueios de estradas são crimes contra a segurança das comunicações, puníveis com prisão de 1 a 5 anos. As penas serão de 2 a 8 anos, quando se crie perigo para pessoas e bens.

O Código Penal prevê ainda o lançamento de projéctil contra veículo em movimento, que é punível com prisão até um ano, se outra pena mais grave não se aplicar em função da intenção ou das consequências. Uma pedra, por exemplo, considera-se um projéctil para tal efeito.

Mas cometem crimes contra a segurança das comunicações os que apenas se "deixam arrastar"? Para além dos líderes, também os meros executores são puníveis como autores. Só a verdadeira coacção poderá excluir a culpa, mas não nos podemos esquecer de que não há dever de obediência quanto a ordens que conduzem à prática de crimes.

Por outro lado, nunca pode ser excluída legítima defesa dos que não aceitam ser coagidos, desde que exercida como meio necessário e não desproporcionado de reagir. Perante uma coacção simples, consideram-se meios de defesa excessivos um homicídio ou uma ofensa grave.

Num mundo globalizado, torna-se necessário promover uma cultura de responsabilidade pessoal. Porém, tal cultura pressupõe a recusa de lógicas económicas, sociais e políticas de "dispensabilidade". O preço da responsabilização individual é o Estado Social. Em todo o caso, bloqueio e ‘lock-out’ são inadmissíveis.


Por Fernanda Palma, Professora Catedrática de Direito Penal.


Correio da Manha.

Nenhum comentário:

Pesquisar este blog