segunda-feira, 21 de abril de 2008

Participação da sociedade, cidades mais seguras

“Ninguém melhor que a própria sociedade para saber onde o calo lhe aperta”. A frase é de Maria João Gaio, presidente da 13ª Área Integrada de Segurança Pública (Aisp) do estado do Rio de Janeiro, correspondente à região do Centro.



Eleita e reeleita para o cargo nos últimos dois anos, a professora de História da Arte e pedagoga convoca e comanda encontros nos quais representantes das polícias Militar Civil, além de autoridades da Guarda Municipal e de órgãos de diferentes áreas e esferas de governo, se reunem com representantes de diversos segmentos da sociedade. A cada mês, uma entidade parceira oferece o café da manha e o local para a reunião.



Para Maria João, a formação da diretoria da Aisp com pessoas da sociedade civil é salutar. “A experiência tem dado muito certo, tanto que a participação vem crescendo bastante. As relações ficaram mais democráticas e aumentou a participação dos órgãos municipais”, conta. Nas reuniões, as questões são colocadas e encaminhadas aos responsáveis, que dão retorno no mês seguinte.



Cerca de 300 pessoas cadastradas recebem, mensalmente, convites que são impressos com o apoio de uma entidade e enviados com apoio de outra. A cada encontro, um palestrante aborda um tema diferente. Já se fizeram presentes, entre outros, a Comlurb (lixo) e a RioLuz (eletricidade). Outras instituições, como o Centro de Valorização da Vida (CVV) e o HemoRio, trazem mensagens de solidariedade.



Rio já tem 60 Conselhos Comunitários



A participação da sociedade nos problemas de segurança do estado do Rio de Janeiro existe há cerca de uma década, quando surgiram os primeiros Cafés Comunitários, semente dos atuais Conselhos Comunitários de Segurança, que hoje são 60.



“Nos cafés, fomos amadurecendo a idéia de formar conselhos formais. Sugerimos ao Instituto de Segurança Pública (ISP) a realização de um fórum, que resultou na resolução que permite criar os conselhos”, explica Mirian Rodrigues dos Santos, presidente do Conselho Comunitário de Segurança de São João de Meriti, na Baixada Fluminense, que trabalha diretamente com o comandante do batalhão e o delegado no planejamento da segurança local.



Mirian conta que o Conselho de Meriti tem pessoas capacitadas em várias áreas que trabalham com as estatísticas e, com o diagnóstico da cidade, ajudam no planejamento da segurança nos locais mais violentos, melhorando, por exemplo, o policiamento e a iluminação. Os cidadãos também contribuem para a transversalidade das políticas. Um exemplo são os cursos de qualificação profissional promovidos pela Secretaria de Trabalho. “Vamos costurando com os atores e articulando políticas que façam crescer a economia e melhore a qualidade de vida”, explica Mirian.



Nas reuniões mensais, o Conselho recebe demandas de diversos segmentos da sociedade meritiense. “As questões de competências das polícias (Civil e Militar) resolvemos de imediato. Quanto às demandas que são de competência dos entes municipais, encaminhamos por ‘ofício’. Temos sido atendidos e, a partir dessa articulação, conseguimos respeito e resultados”, diz Mirian, que representa o Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares da Baixada e Sul Fluminense.



O Conselho de Meriti é composto por instituições como sindicatos, associações comerciais, Rotary Clubs, lojas maçônicas, associações de moradores de diversos bairros, organizações religiosas de raízes africanas, evangélicas e católicas, escolas públicas e privadas, universidades, bancos públicos e privados, OAB, Conselho Tutelar, ONGs e movimentos populares (Direitos da Mulher, Igualdade Racial, Infância, Juventude e Idoso, Saúde, Meio Ambiente etc). Também fazem parte diversas secretarias e órgãos municipais e estaduais.



Uma das realizações do Conselho é a ONG Casa Lilás, um centro de atendimento à mulher - necessidade evidente, já que mais de 40% dos registros da delegacia. Outra conquista é a construção, num mesmo prédio, de uma Delegacia Legal e uma Delegacia da Mulher, a serem inauguradas em 30 de abril – Dia da Baixada Fluminense e Dia Nacional da Mulher.



A próxima grande ação envolvendo o Conselho é um projeto do Programa Nacional de Segurança Pública e Cidadania (Pronasci) que prevê o reforço da ronda escolar pela Guarda Municipal. Também neste projeto, profissionais serão capacitados para informar jovens sobre doenças sexualmente transmissíveis e Aids, prostituição, drogas, os estatutos do idoso e da Criança e do Adolescente e outros temas.



De acordo com Mirian, o Conselho está trabalhando para implantar o Gabinete de Gestão Integrada Municipal (GGIM), que irá reunir diversos entes públicos para buscar novos recursos e investimentos para diminuir os índices de criminalidade na cidade.



Conselhos no Alemão



A nova diretoria do Instituto de Segurança Pública, empossada em fevereiro, prometeu manter o contato com os conselhos, garantindo a continuidade dos projetos. De acordo com o coordenador dos Conselhos Comunitários do ISP, Tenente Coronel Paulo Augusto Souza Teixeira, eles são fruto da mesma reforma que levou à criação das Áreas Integradas de Segurança Pública (Aisps), unindo delegacias e batalhões para uma melhor análise dos problemas e das estatísticas criminais.



“Os conselhos aproximam a polícia da comunidade e vice-versa, ajudando a polícia a conhecer os problemas pela ótica dos moradores”, diz. Ele acrescenta que as reuniões mensais são também uma forma de delimitar de forma clara o papel de cada órgão na segurança publica, informando o cidadão sobre que órgão procurar para cada demanda.



O ISP está articulando com a Casa Civil Estadual um conjunto de ações na área do Complexo do Alemão, incluindo a capacitação de agentes comunitários e de mediação de conflitos, a estruturação de Conselhos locais e o desenvolvimento de um projeto voltado para a violência nas escolas.



Segundo o Tenente Coronel Teixeira, uma das prioridades é garantir que as aulas nas escolas não sejam afetadas pela violência no local. “É a primeira vez que vamos trabalhar com um grupo específico, o escolar, envolvendo pais, alunos, professores e funcionários. Estamos adaptando para o Rio uma metodologia da Rede Internacional de Educação em Situação de Emergência (INEE)”, adianta.



Menos violência com gestão integrada



Não é só em Conselhos Comunitários que a sociedade pode se articular com o poder público. Há um ano foi criado no município de Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, o primeiro Gabinete de Gestão Integrada Municipal da Segurança Pública do país. O GGI reúne as polícias Civil, Militar, Federal e Rodoviária Federal, juízes, promotores, defensores públicos e a Prefeitura, representada pelo secretário Municipal de Valorização da Vida e Prevenção da Violência, Luiz Eduardo Soares.



Nova Iguaçu registrou uma queda significativa de homicídios dolosos em 2007. Segundo análise das informações produzidas pelo Observatório da Violência da Prefeitura de Nova Iguaçu a partir dos dados fornecidos pelo ISP para os anos de 2006 e 2007, a taxa de homicídios dolosos caiu 13,2% de 2006 para 2007. Entre janeiro e novembro de 2006, a taxa de assassinatos foi de 45,5 por 100 mil habitantes. No mesmo período do ano passado, ela caiu para 39,5. Em números absolutos, foram 41 vidas salvas.



O secretário Luiz Eduardo Soares diz não ter a pretensão de atribuir unicamente ao trabalho do GGI a responsabilidade pela queda. “Mas não é despropositado supor que o esforço inter-setorial e inter-institucional tenham ajudado, de algum modo. Se houve avanço na defesa da vida, pode ter certeza de que a conquista - limitada, mas significativa - não tem dono. É da união de nós todos e é da sociedade de Nova Iguaçu”, afirma.



Para ele, a cooperação é importante porque as prioridades podem ser definidas em conjunto e os problemas de comunicação ou outros podem ser solucionados no momento em que ocorrem, uma vez que os contatos se tornam fluentes. Segundo o secretário, no GGI municipal só se age quando há consenso, para que nenhuma instituição se sinta melindrada ou desrespeitada em sua autonomia. “Não há nada melhor para superar dificuldades de colaboração do que o conhecimento pessoal, em ambiente de respeito mútuo, troca, cooperação e diálogo”, diz.



Sociedade ativa muda astral negativo



Questionado sobre a importância da participação da sociedade civil na segurança pública, o criminólogo Gláucio Ary Dillon Soares, do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj), recomendou a inversão do tópico: “Começa colocando a pergunta de cabeça para baixo: qual é a importância da segurança pública para a sociedade civil? Sendo importante, ela talvez se mobilize. E quando o faz, ajuda muito”, disse.



Há cerca de uma década começaram no Brasil movimentos de aproximação de organizações da sociedade civil com os órgãos de segurança. E a partir dessa década, a importância da localidade foi crescendo.



O pesquisador cita o exemplo da redução da violência no trânsito em Bogotá e no Distrito Federal. “Em Brasília, a comunidade do participou do Fórum Permanente pela Paz no Trânsito e da marcha pela Paz no Trânsito. Isso foi essencial para a mudança de astral e a diminuição de mortes”, conta.



Gláucio Soares explica que a sociedade pode atuar tanto através de instituições intermediárias - igrejas, escolas, empresas etc - como diretamente, com trabalho, indo a demonstrações, distribuindo panfletos, escrevendo e-mails. “A questão está no bojo do conceito de cultura cívica”, diz.


Comunidade Segura, 21/04/2008.

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