domingo, 30 de março de 2008

A realeza contra a reforma agrária

O príncipe Dom Bertrand de Orléans e Bragança, 67 anos, passou a última semana em Maringá para participar de palestras sobre agronegócios. A visão do homem que seria o sucessor direto do rei do Brasil, caso o País estivesse sob a monarquia, é de aversão total à Reforma Agrária.

Para o príncipe, os movimentos de sem-terras são “guerrilhas” e os assentamentos não passam de “favelas rurais”. Dos tempos de Império, restam ao príncipe o título de nobre. Os bens da família imperial foram todos confiscados com a proclamação da república em 1889.

Nascido na França durante o exílio da família real, que durou 56 anos, Dom Bertrand voltou ao Brasil junto com o pai, Dom Pedro Henrique , que segundo ele retornou à pátria apenas com a roupa do corpo.

No Brasil, Dom Pedro Henrique ganhou uma casa de um português e vendeu a propriedade para comprar uma fazenda em Jacarezinho. Formado em Direito e residente São Paulo, Dom Bertrand chefiou a campanha da monarquia, no plebiscito de 1993.

Bisneto de Dom Gastão de Orléans e da Princesa Isabel, o príncipe possui um longo nome: Bertrand Maria José Pio Januário Miguel Gabriel Rafael Gonzaga de Orléans e Bragança e Wittelsbach.

Na passagem por Maringá, Dom Bertrand concedeu entrevista ao O Diário. O princípe recebeu a reportagem no Hotel, onde estava hospedado. A seguir, leia os principais trechos da entrevista.

O Diário: Qual o motivo da vinda do senhor para Maringá?

Dom Bertrand: Vim a convite de várias entidades. Falei à Sociedade Rural sobre as ameaças ao agronegócio e, na quinta-feira, participei de uma conferência no Cesumar sobre as oportunidades e também as ameaças que pairam sobre o setor. Dentre essas ameaças está a reforma agrária e os ditos movimentos sociais que, na verdade, são uma guerrilha rural. Eles invadem as fazendas, queimam as casas, matam o gado, destróem as florestas e laboratórios, enfim, uma verdadeira conspiração contra o agronegócio. Infelizmente, isso tudo tem a complacência e o apoio do governo.

O Diário: O senhor é contrário a qualquer tipo de reforma agrária?

Dom Bertrand: Absolutamente contrário. Desafio qualquer economista, agrônomo ou sociólogo a me apresentar um exemplo que tenha dado certo. A reforma não funciona porque não respeita a livre iniciativa e a propriedade privada. Para se ter uma idéia do fracasso da reforma agrária no País, o Brasil tem hoje em dia 67 milhões de hectares de agricultura e 200 milhões de hectares de pastagens. E tem 68 milhões de hectares de reforma agrária. O que produz esses 68 milhões de hectares? Favela rural. Eles só não morrem de fome porque o governo manda cestas básicas que compra de agricultores que produzem.

O Diário: O senhor tem propriedade rural?

Dom Bertrand: Tenho, com meus irmãos, uma micropropriedade, um sítio no Estado do Rio. Mas fui criado em uma fazenda que meu pai tinha em Jacarezinho. Passei toda minha juventude na fazenda.

O Diário: Como é o dia a dia do príncipe hoje no País?

Dom Bertrand: Viajo muito. Coordeno o Movimento Monárquico, junto com meu irmão, e também um grupo de brasileiros idealistas, chamado Paz no Campo. O objetivo do Paz no Campo é alertar contra as ameaças que pairam sobre o futuro agrícola do País.

O Diário: O Paz no Campo tem relação com o movimento Tradição, Família e Propriedade?

Dom Bertrand: O Tradição, Família e Propriedade teve um problema atrás e, portanto, não estamos mais falando em seu nome. Esse movimento está nas mãos de outras pessoas.

O Diário: As pessoas o reconhecem quando o senhor está na rua?

Dom Bertrand: Reconhecem. Outro dia, saindo daqui do hotel, um rapazinho do curso secundário parou e disse: “Ah, o senhor é o príncipe Dom Bertrand...”.

O Diário: Qual a avaliação do senhor sobre a República?

Dom Bertrand: Uma coisa essa é certa: hoje em dia ninguém afirma que a República deu certo. O Brasil deu certo até 1889. Depois de 15 de novembro de 1889 (data em que foi proclamada a República e marcou o fim da Monarquia brasileira) começou o caos neste País. Para se ter uma idéia, nós fomos um dos primeiros países do mundo a ter uma rede telefônica (segundo historiadores, D. Pedro II teria dito: “- Meu Deus, isso fala!”, ao ouvir a voz de Graham Bell ao telefone, em uma exposição no ano de 1876, nos Estados Unidos. Um ano depois, a rede era instalada no Rio de Janeiro). Fomos o segundo País do mundo a ter selo postal. O primeiro cabo submarino ligando a América Latina à Europa era nosso e ainda tínhamos a segunda maior marinha do mundo.

O Diário: O senhor imagina como seria o Brasil hoje se a Monarquia não tivesse acabado?

Dom Bertrand: Há uma pesquisa que as Nações Unidas publicam todo ano sobre o Índice de Desenvolvimento Humano. Entre as quinze primeiras nações da lista, dez são monarquias. Isso porque a Monarquia garante a unidade, a estabilidade e a continuidade à nação, coisas que a República não garante. Com a Monarquia, o Brasil certamente teria continuado na via de progresso e modernidade. Rui Barbosa, que foi quem redigiu o decreto da Proclamação da República (deputado e jornalista, Barbosa escreveu o decreto número um, que anunciava a escolha da forma de República Federativa, com as antigas províncias constituindo os Estados Unidos do Brasil), algum tempo depois se dizia arrependido. Uma frase célebre dele diz: “O parlamento do Império era uma escola de estadistas. O congresso da República transformou-se em uma praça de negócios”. Não sei o que ele diria se visse Brasília hoje.

O Diário: A família real recebe algum dinheiro do governo?

Dom Bertrand: Não, nenhum. Além de não recebermos nada, após a Proclamação da República, foram confiscados todos os bens da família, que foi exilada.

O Diário: Como o senhor garante seu sustento hoje?

Dom Bertrand: Tem as doações de monarquistas e tenho meus meios de vida também.

O Diário: Caso a Monarquia voltasse ao Brasil, quem seria o rei?

Dom Bertrand: Nesse caso, o meu irmão mais velho, Dom Luiz. Depois dele, seria eu. E como eu não tenho filhos, a próxima geração seria representada pelo filho do nosso irmão, Dom Antônio.

O Diário: O senhor teve uma preparação especial, como príncipe?

Dom Bertrand: Isso vem com o sangue. Ouvi os familiares e meus pais contarem. Papai (Dom Pedro Henrique) voltou do exílio só com a roupa do corpo (após a Proclamação a família real foi exilada na França e só retornou ao Brasil em 1945) e um português rico do Rio de Janeiro lhe deu uma casa. Ele vendeu a casa e comprou uma fazenda no Paraná, de 73 alqueires, em Jacarezinho, onde criou seus 12 filhos. Mas, um dos conselhos paternos que mais agradeço ter recebido foi quando ele nos reuniu no jardim da casa da fazenda e disse: “Meus filhos, vamos aproveitar as únicas coisas que posso deixar para o futuro de vocês. Porque 73 alqueires divididos para 12 filhos não vão fazer a vida de ninguém. Mas eu posso deixar algo que é muito maior que isso. Em primeiro lugar, a fé católica apostólica romana. Em segundo lugar, uma boa educação e, em terceiro lugar, a consciência de uma missão histórica a realizar pelo Brasil. Preparem-se, que um dia o Brasil os chamará”.

O Diário: O senhor votou para qual candidato nas últimas eleições presidenciais?

Dom Bertrand: O voto é secreto, mas não votei no Lula.


Fonte: O Diário do Norte do Paraná, 30/03/2008

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